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quarta-feira, 27 de setembro de 2017

PORQUE AS FERIDAS AINDA ARDEM

Nem todo o amor é uma causa perdida, e dizem que há sempre um pronto-socorro para lhe acudir.
Claro que não é assim, mas também ninguém leva a mal.
Não se voa com a asa ferida, assim como os sapatos assentes no chão, não sacodem a poeira das ausências.
É morosa esta espera de te querer.
O tempo está preso num atilho, e sente-se a aflição das horas vadias, que dele querem sair.
Há um ponto de fuga pintado desdenhosamente pelas luvas de um guardião, feitas com as peles que assassinaram.
Não sou tu!
E tu não me tens já no olhar.
Sorrimos neste abraço desabrigado, espalhando cinzas para regar as memórias que nos mentiram.
Porque as feridas ainda ardem.



2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

PARA QUE CONSTE

1
Nunca encontrei a vergonha
que pretendiam
que sentisse.
2

Dou graças a mim,
por aquilo que sou.
Mesmo assim.
continua a dar-me muito trabalho.

2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

LIXO

Há coisas para resolver.
Não apresso o tempo, não dou corda aos dias,

talvez num sábado à tarde renove a razão.
E a razão, muitas vezes, é coisa de momento.

Aqueço a garganta no fogo-de-santelmo
e unto as mãos com a cinza
que marca o outono desprezível.
Ilustro o telejornal
só com notícias da minha sabedoria,
e,
no nevoeiro que ilumina as botas,
escrevo botões que não sei coser.
Não procuro explicações

para aquilo que não pretendo conhecer.
Há muito tempo que não uso esse relógio.

 2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

AI DE TI

Ai de ti que nem do teu inútil eu
consegues fugir.
Velha carne,
pele enrugada,
sórdida estima,
verruga negra
massajando uma sarna vulgar,
degeneração amanhada
num abrolhamento prévio,
visão ferruginosa
que pena esta vida
que tanto te castiga.



2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

GESTOS QUE NUNCA TOCARAM A PELE

Na ponte onde a
s estrelas descansam,
molhei o teu véu
de núpcias em 2ª mão.
Tingimos o céu
com um breve instante
de ternura.
Fizemos do amor apetecido
um fugaz naufrágio,
não compreendido
pelos amantes obsoletos.
Maldigo a paixão reprimida
e a ausência dos gestos
que nunca tocaram a pele.



2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

CRÓNICAS DE VILA CHÃ (saudades que ainda não morreram)

Isto dantes era diferente.
Mas porque ficámos assim?
Triste deitar, igual no acordar, nunca diferente até o sol fugir. Terra que amámos e que tanto nos bate. Geada que nos queima os dedos, ao domingo na missa pagamos os medos, e na noite em que o frio nos visita, estendemos lenha para que a manhã tenha vontade de se compor. Racha-se o tempo neste cada vez mais seco rio, onde havia um palácio que moía algum do nosso suor. Há um forno que se acende de quando em vez.
Abraçam-se saudades que ainda não morreram.



2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

ESPERAR É UM VERBO COM TEMPOS MENTIROSOS

Esperei-te até nunca na fonte dos desejos tardios.
Entontecia os teus passos fingidos,
espalhando lágrimas na mágoa,
para iluminar a tua chegada,
como se tu acontecesses
neste estio só molhado
pelo teu olhar.
Voltava para o mentiroso caminho,
que sempre me empurrava
para o vento da tua ausência.
Mirava a lua,
com todos os quartos da desilusão.
Eu.
E o que de mim
já não era,
acariciado pelo lamber do meu cão,
que tanto farejou a tua espera.
Esperar é um verbo
com tempos mentirosos.
 


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

PODES CONTAR-ME UMA HISTÓRIA?

Não me apetece adormecer.
Nem limpar o pó da televisão.
Hoje não peguei em livros,
não espreitei oráculos proibidos,
nem fiz que sim nem que não.
Há folhas sem ti - canetas assim
- horas sem mim - canais interditos
- ideias pré-pagas – e não tenho pena
dos canais enrouquecidos
pela ausência da minha curiosidade.
Podes contar a história da avozinha
que se zangou com o lobo mau –
por não ter comido a chata da netinha.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

PASODOBLE

Por vezes penso que a pele que tirei do meu corpo, não condizia com o fato das minhas ausências.
Estico sempre a corda ao máximo da minha pretensão. Doida mania nos tempos que tão depressa correm, e no meu eu desatento, salto galopes sem destino à vista. Irei como um cavalo louco, enredando um trote alucinado, desobedecendo à intermitência dos semáforos. Solto a sela ao som de um pasodoble, memória de uma velha infância. Que sonhos vivi nesta recordação. Tento agora apagar nódoas, para as enterrar num talhão que ninguém visita. Nunca entreguei a glória ao inimigo. Castigava-a na forja com golpes precisos que martelavam os meus desejos.
Confio no tempo.
Só até ele não me roubar aquilo de que mais gosto.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

SITTING BULL

Terra Sagrada.
Búfalo Irmão.
Rifle Assassino.
Sangue no Chão.
Nós que tudo demos
na doidice da ilusão.
WE SHALL LIVE AGAIN!
É agora a canção triste do coyote
que geme na pele do tipi.
A Mãe natureza
chora as mais tristes
Madrugadas.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

NÃO TENHO SEMPRE OS DIAS DO MEU LADO

O que de mim,
 já meu não é,
repousa agora encerado,
na doce hora que fecha o caminho.
Não tenho sempre os dias do meu lado,
e nos desencontros que vamos dividindo,
tentámos fingir um entendimento,
que mantenha a ilusão
de nos suportarmos.
Trocámos de ratoeiras,
dispomos os cartuchos por ordem alfabética,
e colocámos com toda a pressa,
os nomes no último lugar da fila.
Claro,
que sabemos de cor
este bluff tantas vezes ensaiado.




2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

NÃO RESPIRO AS LÁGRIMAS DO MEDO

Não respiro as lágrimas do medo,
nada sei do seu segredo,
nem dos sonhos azougados
que prometem.
Gosto dos quadros que me desafiam,
daquilo que sempre me confia
o diferente.
E assim consolo os calos
que vão enfeitando
o correr do tempo.
Acordo nada surpreendido,
mudo de pele como se fosse gente,
e sossego o olhar
com lentas despedidas,
sempre fora do lugar
que cada vez mais me aparta.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

SELF-I-E – SE QUEM PUDER!

Os sonhos que adormecem nas esteiras, acordam surpreendidos com o alvoroço dos serviços de notícias matinais. Vomitam o enjoo na sanita mais próxima, escrevem à pressa qualquer coisa sem nexo no papel higiénico e lavam a genitalidade num morno banho salubre, isento de qualquer taxa correlativa. Vestem-se com uma penumbra não obsoleta, cortejam o sorriso da cordialidade, e disfarçados de croissants mal paridos, escondem no fiambre hábitos apodrecidos. Na hora da verdade, que a eles nunca assiste, engraxam olhares fumados, embrulhados com etiqueta gourmet. Despertam o trejeito emplumado, deslizando na velha calçada farta deste andar. Alugam o olhar sem eira nem beira, haja alguém que queira e mais outro para o achar. Encostam-se a estátuas alisando as tatuagens, dão brilho ao inox e fingem a pose da melancolia.
Self-i-e - se quem puder!
Há que ficar bem na tótógrafia.
 


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

Vila Chã

CRÓNICAS DE VILA CHÃ (no lenço da saudade)

Nesta conversa, as palavras que a molharam nunca poderão ser escritas. São como os sonhos sem destino, plantados numa nuvem que para sempre fugiu. Digo-te com os fragmentos de um coração empedrado, que os sentimentos só duram a circunstância. O contexto, essa anormalidade ocasional, não passa de uma cretina estupidez, onde os pardais não argutos, cuscam sementes enferrujadas. Mas, eu aqui no silêncio das estrelas com as horas que secam o tempo, enrolo o mastigar desta constante solidão de que todos me falam. Qualquer dia não será diferente de ontem. É uma ignóbil parecença que não nos dá qualquer vantagem. Ouço histórias que de tão repetidas, me fazem reconhecer a sua veracidade. Há gente nova a tocar concertina, perante o olhar dos mais velhos, que desconfiados, não fingem o simples facto de gostar. E recordam no lenço da saudade o baile mandado daqueles loucos sábados à noite.
Isto está empestado de Parkinsons e Alzheimeres.
Hoje três pessoas cumprimentaram-me num andar cada vez mais cansado.
Bom dia.
Boa nôte.
Até quando?



2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

Vila Chã

CADA UM SABE DE SI


Ela costumava dizer que não há amor como aquele que não se lembra. Mas o guarda dos sonhos mais húmidos, teimosamente rondava a sua combinação. Na euforia mais atrevida, descia as alças, baixava as calças e na curva mais escondida, desafiava o engenho dos 5 contra 1. Arfava devagar, baixava o som, da voz mudava o tom, e subia o monte em ponto morto, mentindo o amanhã com um sexo diferente. Acordava à pressa. Não queria falhar a promessa. Deus o tenha em bom lugar. É assim que espirram, quando vem à baila a sua lembrança.
Cada um sabe de si.
& só os estúpidos continuam a acreditar que Alguém sabe de todos.




2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Vila Chã

O QUE É FEITO DE TI?

O que é feito de ti?
Enrodilhado nessa redoma de algodão naufragado,

com que o absurdo te decora a pele.
O que é feito de ti?
Beijos de todas as carências,

que nem sequer escondem
a mágoa desta lonjura.
Não és mais do que um brinquedo de lata,

escondido na banca da feira.
És o distante que sempre foge,

um passar atropelado pela pressa
que te afasta de tudo.
Essa bengala enxertada em sombras vazias, que amparam a angústia do dia que não vês nascer, é um prego que enferruja o teu desejo.
És um equívoco bem intencionado,
um amante sem arte direccionada
para os artifícios que sempre te magoam.
O que é feito de ti?
Aparição vaporizada,
cozinhada numa refeição
sempre triste.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA
Vila Chã

7

7
Medos vestidos de borboleta assolaram à porta do paraíso e mentiram 7 discursos do mais ousado fingimento.
Quem os escutava sorria sem qualquer interesse, para o ocaso mais próximo.
7
Vénias foram exumadas em memória dos 7 anjos ebriamente contemplados.
Depois o éden fechou as portas para reservar o direito de intromissão.
7
Pragas foram canonizadas num delicioso churrasco saboreado por convidados espaciais.
Na hora da despedida, todos cumprimentaram alegremente a sua não identidade.
7
Sóis pintam as alturas com tons desconfiados, e não se importavam quando o mijo caído do céu, esborratava os seus poemas.
7
Poetas descalços, distribuem poesia à boleia de 7 estrelas expulsas da constelação de Hollywood.
7
Velhas máquinas de escrever disputam entre si,
o mais celestial cântico do teclado.
7
Murros mantêm a secreta esperança, de socarem num rápido knockout, uma delinquência a quem chamam humanidade.
 
2017set_aNTÓNIODEmIRANDAVila Chã

O TEMPO VAI FICANDO CADA VEZ MAIS VELHO

Sinto-me mais ou menos.
O que não é lá grande coisa.
Os dias vão andando,
molhando os anos
quando não há mais nada para acontecer.
Visito as memórias habituais
por mera questão de cortesia.
Parto a cabeça em parcas fatias de melância,
e na banca da praça,
à peixeira do costume,

pergunto pelo peixe
que não evejo exposto.
Responde sempre da mesma maneira:
já o tive!
Era tão bom que desapareceu num ápice.
Sobretudo o que não existe
tem este mentiroso hábito.
Aqui nesta aldeia,
toda a gente sabe tudo.
Até porque o queixar-se,
é uma coerência assumidamente mantida.
O tempo vai ficando cada vez mais velho!
E não é que agora,

o tinhoso,
cismou em tornar-nos mais enrugados?




2017set_aNTÓNIODEmIRANDA
Vila Chã

TRAÇA NAS VALETAS AUSPICIOSOS PLANOS

Neste céu sem lugar adquirido,
arrastava um voo como se fosse águia,
e circundava a nuvem fingindo o habitual looping picado.
Perdia o tempo nos lampejos lacrimosos,
visitando as estrelas adormecidas.
Pintava a vontade com os tons de um Alzheimer conhecido, e nos intervalos da chuva chorada
mentia alguns sorrisos.
 Faltava-lhe o sal da vida,
coisa que não notava na comida requentada,
que lhe entregavam com a pressa carimbada
da obrigação social.
Não quer lembrar-se das contas que fazia,
encostado ao balcão do destino
que sempre o endrominou.
Sentado no velho tractor,
traça nas valetas auspiciosos planos,
só para um futuro que nada lhe prometa.





2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

Vila Chã

NÃO GOSTO DESTA CIDADE

Não gosto desta cidade.
Trocou-me as voltas.
Dei-lhe a minha alma e ela agora oferece-me um retorno sem destino. Acho-me tão distante neste tremer de mãos sempre à procura do lugar possível. Nunca me sinto melhor. Dei-lhe a minha alma e agora caminho como um cão com trela. E é proibido mijar nas esquinas. Olho para o letreiro dos eléctricos só para lembrar a vontade de neles entrar. É um trabalho sujo este detestar os lugares que amei. Dou-me mal com os cheiros que não conheço e amareleço sem querer este sorriso outrora companheiro inseparável.
Onde estou?
Numa encruzilhada de tabuletas impregnadas de palavras que recuso ler.
Ondas de medo enchem o meu sonho com o tamanho medonho apertado pelo meu cinto, afastando aquilo que gosto. E um acorde alucinado que geme na minha guitarra, aguarda o solo do mi dobrado num dó de tanto penar.
Voltarei à cidade, para aquele lado selvagem, onde várias vezes vivi a surpresa. Tudo era diferente naquele tempo. E os pais das miúdas ficavam chateados quando me conheciam. Estive em jantares com a minha indesejável presença. Algumas mães eram gentis desconfiadas, geralmente com um pedido no olhar. Não faça mal à minha filha. Escutava ameno esta cavaqueira de merda. Não é assim que se recebe um ínclitico hóspede.
Mais tarde provou-se que o anjo era eu.

2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

O MUNDO É O LUGAR PERFEITO PARA DIZER...

Compreendes o que quero dizer?
Tempo, tu o amigo ardiloso que nesta canseira funesta, roubas como se não fosse vontade tua, o pouco que de mim resta.
É verdade que nem sempre acreditámos nas nossas ilusões. Mas eu pensava que não era tão inocente, e de ti esperava qualquer coisa de decente. Nunca coubemos nesta história e perdemos o mundo de costas voltadas, entretidos nos duelos previamente sincronizados. Desconfiados espalhámos um olhar comprado nos saldos da tola conveniência. Douramos a paciência com a pílula do fingir que qualquer coisa podia ter sido.
O mundo é o lugar perfeito para dizer, que quase sempre nunca, ele presta.
2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

FACEBOOK

Evidentemente
não partilho o seu ponto de vista.
Mas…
Poderei colocar um “like”
despretensiosamente
mentiroso.
Eventualmente.






2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

CORRE COELHO

O coelho tem maus hábitos.
Já toda a gente devia saber.
Fala na tv com a voz entupida,...

jurando que naquele tempo,
não nos queria foder.
É tão acre o seu cócó,
que até nos dá dó.
Esconde os dentes de vampiro
e num merdoso suspiro,
alisa a queda do cabelo,
espalhando penumbra
nas palavras sempre mentirosas.
É um boy filho da trapaça.
Alguns ainda acham graça,
mas o seu tio
já empenhou o espaço publicitário.
Corre coelho,
taparam-te a toca,
ninguém te quer no aviário.
De nada és culpado?
Só a tua estupidez diz o contrário.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA



Boa Malta.


AS 11 PEDRAS DE MOISÉS

Então,
outra vez por aqui?
O que é que se passa?...

Isto não anda nada bem.
Estou derrubado.
A ciática não me larga.
Essa coisa das tábuas de pedra,
não foi lá grande ideia.
É pá,
mas eu hoje não estou para aíi virado.
Aliás, há muito que desmontei
a tenda dos milagres.
Mesmo assim,
digo-lhe com toda a franqueza:
não há quem enrole charros melhor
que o Senhor!

2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

NADA ACONTECEU !

Só quero absorver esses lábios
que me queimam a pele.
E enferrujar-te as veias ...

com a seringa do amor
possível.
Não acredito neste céu mentiroso,
projectando cenas dos próximos capítulos
das ausências continuadas.
Nada aconteceu!
Marés tolas
molhando a minha cabeça,
com salpicos de Rock`n`Roll.
Fala com o Lou Reed.
Mesmo morto ele continua a explicar.
Não comentes a minha sanidade.
O meu cérebro pede-te o mesmo.
& eu também.

2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

Ó LORD COMPRA-ME UM FERRARI

Ela era uma boa rapariga. Vendia o amor vestido numa lingerie sofisticada, e gemia o sexo num surround system envolvente, que enlouquecia os hóspedes do piso 21.
O pagante ocasional, envergonhado por tamanho enleio, só pedia um pouco de decência, para evitar tamanha escandaleira.
Na surdez dos headphones, ela sorria e ainda mais aumentava a matreirice....

Vestindo-se á pressa, pagou o serviço, saiu sorrateiro maldizendo a chatice.
Ela admirada, mirou a snaifa rapada, aconchegou a pilinha, e disse para o rímel despenteado:
Este foi mais rápido do que uma mijinha.
Ligou o kompressor, e arrancou visivelmente bem disposta,
Amanhã irá fazer a inspecção periódica á púbis e liquidar o imposto da fodação.
Foi pena.
Disse para o cão:
muitas vezes,
aquilo que me vale,
és tu.
2017set_aNTÓNIODEmIRANDA
Vila Chã

VELHOS CONHECIDOS - GRANDES AMIGOS.


CRÓNICAS DE VILA CHÃ (fechou a porta)

O barbeiro de Sevilha já não faz a barba.
Enlouqueceu precocemente a afiar a navalha que lhe aparava certas manias. ...

Artista evoluído, dizem da arte entendido, manejava o pincel como não havia ninguém.
Beijava antes do deitar, os calendários com as gajas que sossegavam a sua tendência sexual.
Maldita trombose que o pôs três meses no hospital.
Voltou à terra, agora um planeta estranho, e a curiosidade dos energúmenos lá da aldeia pela sua maleita, causava-lhe um mal estar encardido.
Agarrado ao pau da sobrevivência, o único que agora funcionava, compunha o andar de outrora, e indiferente aos tropeços, teimava em justificar que o que se passou, já era. Abriu a porta do estabelecimento, e num choro silente, rasgou com as lágrimas que lhe restavam, as fotografias da sua memória, que agora eram só caras estranhas.
Fechou a porta.
E enferrujou a chave do amanhã que o apodrecia.
2017set_aNTÓNIODEmIRANDA
Vila Chã

GOSTO ! & MUITO! Com um abraço para o Miguel Martins e Ricardo Álvaro.


CRÉDITOS MALPARADOS

Nada é fácil neste desenrolar de cobertores
que só aquecem a sombra dos meus medos.
 
Pisco os olhos à solidão, velha amiga
nestas viagens à volta do espelho.
 
Apenas me lembro do longe que não queria,
enrolado neste novelo sem ponta para fugir.
 
Há um não sempre presente,
e um gesto ausente
que celebra esta sequência
de créditos malparados.
2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

SWEET DREAMS

*
Dormirei


com
a
possibilidade
de
acordar
no
nevoeiro
do
teu
sexo
*
 O amor
É uma larga
Distância
Muitas
Vezes
Com pontes
Mentirosas
E
Nunca
Se escreve
Com o mesmo
Alfabeto
*
Todo o cheiro que deixaste
Dorme agora ao meu lado
Abraçando a nudez
Para que o desejo desenfreado
Espalhe no colchão
as breves delícias
De um amor que passou ao lado

2017set_aNTÓNIODEmIRANDA

Muddy Waters - "Rock Me" [Vinyl]


The Doors and John Lee Hooker - Roadhouse Blues (Complete)


EDDIE CLEARWATER / CAME UP THE HARD WAY


Lightnin' Slim - Winter Time Blues (1998)


domingo, 3 de setembro de 2017

ORAI POR NÓS, MAS NÃO PERCAM MUITO TEMPO

Orai por nós:
Os desertores da infâmia.
Os que com sangue regam gota a gota
as rosas com espinhos arrependidos.
Os que estão sempre prontos para cair na tentação.
Os que só ajoelham para determinada posição.
Os pervertidos da glória.
Os travestidos da memória.
Os que continuam a sonhar com outra coisa.
Os que não fazem outra coisa senão sonhar.
Os que teimam em tapar o buraco
da camada do ozono com bolas de naftalina.
Os que só pensam em introduzir no buraco do Osório.
Os que se vendem mesmo por preço irrisório.
Os sérios, os graves, os desanimados.
Os ridículos, os burlescos, os grotescos, os cómicos.
Os bizarros, os pífios, os tolos, os engraçados.
Os gozados, os satíricos, os caricatos.
Os disformes, os velhacos.
ORAI POR NÓS, MAS NÃO PERCAM MUITO TEMPO.
Os preocupados sem futuro.
Os desocupados no futuro.
Os medíocres.
Os que escrevem arritmias nos murais
das redes sociais.
Os que injectam doses optimistas.
Os que mantêm teimosamente
ventríloquos tresloucados
E entopem artérias
com todos os sentidos proibidos.
Os que amam nos tempos difíceis.
Os que dormem na vertical.
Os que morrem à pressa.
Os que demoram a viver.
Os que nos aborrecem sordidamente.
Os que usam nós de gravata
completamente desafinados.
ORAI POR NÓS, MAS NÃO PERCAM MUITO TEMPO.
Os mal-educados.
Os analistas do fluído vaginal.
Os que pedem sempre desculpa numa frequência imoderada.
Os indiferentes.
Alguns indigentes.
Os menos inteligentes.
A carpideira.
A moçoila namoradeira.
O petiz aprendiz.
Os que não corroem a corrupção.
Os fatídicos.
Os distraídos.
Os mal dizentes.
Os mordedores de inveja.
Os sábios sem nexo.
Os que não têm de nós boas ideias.
Os que fugiram à boleia e voltaram de táxi.
O difícil sem fácil.
Os pensamentos mal frequentados.
Os esquisitos.
Os requentados.
Os esquentados.
Os bons e os malvados.
Os putativos.
Os inerentes.
A barata no topo do bolo.
O engraçado que só é tolo.
A dignificação.
A insubmissão.
A sublimação.
A efervescência.
O esturro do tacho.
Quem se deixa ser capacho.
ORAI POR NÓS, MAS NÃO PERCAM MUITO TEMPO.
A sílaba mal colocada.
O ponto sem nó. A exclamação desfocada.
Os desarrumados mentais.
E também os sentimentais.
Os que confundem bóbós com papos de anjo.
O padre que diz que perdoa.
O pecado que não magoa.
Os curandeiros mal tratados
Os políticos menstruados. O deputado marmanjo.
Os que tomam conta de nós.
Os que às vezes odeiam
e arrefecem na fogueira
sacrifícios a um deus desconhecido.
Os autoclismos desprezados.
Os desenganados do amor.
O amor não reconhecido.
Os epitáfios não lidos.
ORAI POR NÓS, MAS NÃO PERCAM MUITO TEMPO.
Os incautos. Os perdulários. Os inaptos.
Os inadaptados. Os adoptados.
Os arautos. Os anormais. Os colegiais.
Os coloquiais.
Os que gritam Toni faz-me um filho
mesmo sabendo que eu só me chamo António.
Os que me pedem a camisola,
não se importando com o frio que depois teria.
Os agradecimentos. Os sentimentos.
As mulheres mal-aventuradas
e também as desgraçadas.
As menos interessantes. As de ventre inchado.
As desconfiadas.
Os epicentros. Os retábulos. Os oráculos.
Os oratórios. Os sacrários. Os dromedários.
Os anjos sem cabecinha e com asas de cebolada.
Os conventos. As carmelitas.
As recolhidas. As não escolhidas.
As que f…. às escondidas.
As noviças. As nabiças.
As metediças. As mestiças.
As clandestinas e as dominicanas.
As virgens imaculadas . As louras. As oxigenadas.
As infectadas. As perfuradas.
Os eclesiásticos da parábola do falo.
Os faloqueiros e azeiteiros.
A serenidade embutida nas alas psiquiátricas.
Os obscenos. Os helénicos. Os frenéticos.
Os morenos. Os patéticos. Os angélicos.
ORAI POR NÓS, MAS NÃO PERCAM MUITO TEMPO.
A beleza da incerteza.
As musas mediáticas e as dores ciáticas.
A visita guiada. A colaboração.
A pena. A temperatura amena.
O turismo sexual.
O casamento conveniente.
A proposta indecente.
O anel de diamante.
As bodas de fígado. A foto à la minute.
O minete feito à pressa. O linguado desajeitado.
O orgasmo não adquirido.
Os onanismos coerentes.
As práticas indecentes
O resto que nunca interessa.
A faca na liga. A cintura descaída.
O peito flácido. A ária do Plácido.
O domingo soalheiro. O furo no mealheiro.
O jet leg. O jet set. O cinc à sec.
Os astronautas e argonautas.
Os anabolizantes e fertilizantes.
Os debutantes e os não principiantes.
A família que não escolhemos.
A paciência que não pudemos.
A fodação Internacional.
A importância do espanador.
Os suicídos que estão para vir.
Os que gastam a vida a carpir.

Orai agora por mim.
Aquele que nunca será o vosso salvador.


,2016,07aNTÓNIODEmIRANDA

Bulimundo - Bulimundo









BULIMUNDO
(Para o Alexandre Neves)


Corri o o mundo
fugi do mundo...

mas nunca encontrei outro lugar.
Vivi em barracas sem o céu da minha terra
fiquei além de mim para viver em guerra
mas nada sabia desta vida.
Caí para o mundo
mas não havia funaná para dançar.
Bulimundo onde me chamam vagabundo
mas eu só queria um torrão da tabanka
onde os meus pés descalços eram felizes.
Parti morri não pertenço aqui
onde outras músicas tocam corações não meus
e sempre de mim ausentes.
Que faço aqui onde o meu lugar é uma ferida?
Não quero morrer da tristeza
onde algo maior que a fome me mata.


 
,aNTÓNIODEmIRANDA