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terça-feira, 23 de maio de 2017

Reverso 03: primeiro dia _ 2017maio18_Cossoul

 
 

THE DOORS








 
RIDERS ON THE STORM

Toda a gente devia saber que apenas precisas dum amigo.
Bom dia sussurras gentilmente ao meu ouvido mas não te posso prometer que estou de volta.

Devo esperar a demora que o tempo leva a fazer todos estes erros.
O que digo ou faço não importa .

Não é ainda a hora de derramar o choro destas lágrimas instantâneas.
Dizes-me isto e aquilo mas nunca o que eu quero ouvir.
Serás mais um dos anjos perdidos ?
Ás vezes poderei ser aquele que bate à tua porta.
Mas não me dês chave nenhuma : eu quero mais, sem ousar transformar a tua vida num inferno igual ao desassossego que me é realidade.
Preciso de alguém que não necessite de mim.
Outras vezes sou uma serpente à procura da pele esquecida.
Boa noite, JIM .
Agora vou abraçar todos os cavaleiros da tempestade
.


aNTÓNIODEmIRANDA

quinta-feira, 18 de maio de 2017

NO PALCO DOS SONHOS

ACTO1

No intervalo do ápice,...
saltita a vírgula apressada
que perante a ausência do aplauso,
faz uma pausa agradecida,
ensaiando vénias fora de uso.
O público humedecido
sai pela porta do fundo,
levando escondida
a récita que o emudeceu.
Nada disto constava no cartaz,
nem tal foi aflorado na conferência de imprensa.
A crítica sabiamente enaltece
a falta de interesse
abundantemente manifestada.
No teatro vazio,
fantasmas nostálgicos
brincam com as mais loucas coreografias.
No palco dos sonhos,
baratas julgadas tontas
podem agora jogar ao berlinde.


ACTO2

 Acordou a máscara.
Pendurou a maquilhagem.
Farto de ser ele próprio,
vestiu a personagem para que tudo
voltasse ao princípio.
Aliviado,
cortou a cena em pequenos actos
e cozinhou com todo o amor
a sopa dos pobres.


ACTO3

 3 pancadas
atingiram a sua fé!
Nunca mais voltou a ser o mesmo.


ACTO FINAL

Correu-se o pano,
que foi dobrado em mil mortalhas.
Congelou os soluços
que escorriam pelos pulsos.


,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

MEMÓRIA MAL- INTENCIONADA

Todo o tempo do mundo que agarro na mão
faz de mim o caçador solitário neste jardim,
despejando uivos dourados
cantados nos alcatruzes da velha nora.
Traz-me sons de lembranças coradas na relva idosa,
onde flores esquecidas agradecem o meu aparecimento.
Pé ante pé, cortejo as mais desprezadas,
e rego-as com o sorriso que trouxe da fonte
onde bebi quezílias pacíficas.
Para longe vai o sol levando todo o cuidado
para não cheirar a lua.
Pintado pelos pastores,
o laranja que consola o céu,
risca um vento suave
para juntar as cores mais bonitas.
Todo o tempo do mundo,
é agora uma alegoria cantada pelos cães,
que assim saúdam a primeira estrela.
E eu encostado ao mais velho dos poemas,
olho para esta folha onde dorme a minha pena.
E numa alegre despedida,
enlaço o olhar de tanto gostar
de saber que ainda há muito mundo
que não compreendo.
Não quero saber de acrobacias,
nem de palavras cosidas em patchwork,
nem de interpretações artificias.
Agora! Repito, Agora!
Qualquer elogio para o que escrevo,
é uma memória mal intencionada
para aquilo que não sei se sou.



,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

1...2...3...4...5...6...7...8

1.
A excepção à regra,
torna a regra imperfeita.
2.
Num prefácio breve,
palavras curtas serão sempre bem-vindas.
3.
Vistas curtas,
não alcançam grandes caminhos.
4.
Em boa verdade,
tolos & loucos há muito poucos.
5.
Há sempre alguém que nos diz:
Tem cuidado!
& isso abana qualquer interesse.
6.
Se alguém que não prezas,
tende a elogiar-te...
não percas tempo a ouvi-lo
7.
Deitar cedo e cedo erguer,
só quando não se tem nada para fazer.
8.
Candeia que vai á frente...
geralmente chega em 1º lugar.

,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

ESTÁ CALMO ESTE ENREDO...


Está calmo este desassossego,
neste sobe e desce do pensamento,
que numa sofreguidão incontida,
cose com linhas podres,
este tardio contentamento.
Está cheia esta paragem sem aconchego
para os restos que agora descansam.
Leio no anúncio,
qualquer coisa fora de mim,
e num olhar arrastado,
conduzo sorrisos não sei de quê.
Está difícil este céu
com peso demasiado
para a fragilidade que me danifica.
Não tenho jeito para colorir celebrações,
nem empatias erradamente diagnosticadas.
Irei certamente repousar
no olvido das memórias falidas,
encurtar o pavio com todo o cuidado,
e esperar sem crer,
uma aparição
minimamente digna desse nome.
Está calmo este enredo...

,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

 


COISAS QUE DE MIM NUNCA SOUBE

Dizia-me ao ouvido perguntas para um teste que não conseguia perceber.
E eu quieto, neste fim de vida na minha varanda plantado, rodo todas as clepsidras e fujo do tempo que quer tombar as velas pintadas nestas ondas de incerteza.
É certo, talvez ainda não para mim, que o vento sopra um lamento apressado, escrito com esta espuma que entrega as palavras, no mar que de mim sai.
Só porque aquilo que quero,
já não se lembra de mim.
Chicote desalmado, dor insana e prurida, coisa impura tão sofrida, que pousa na janela que não quero abrir.
E, se um dia te falar,
coisas que de mim nunca soube,
deverás acreditar
que poderão ser verdade.
Mas a vida é um espelho ardiloso,
o amor um verbo com tempos inúteis,
onde nada poderá existir para além
de um presente perdido.
Nada te posso prometer!
Mas gostaria que nos amássemos
na próxima oportunidade.
Que deus te assoe,
que eu agora já não tenho lenços.
Que alguém te ilumine,
porque eu perdi o isqueiro.





,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

A NOITE CAI NESTE MUNDO DESABRIGADO

Que poemas poderei escrever, eu o miserável não arrependido, anónimo sobrevivente desta infâmia incólume, que queima a chuva que agarro com estas mãos prenhes de promessas inocentes. Alguém me valha no meu querer de não me salvar, com que humedeço lágrimas do céu que me agradecem o breve instante do arranhão onde guardo todos os beijos.Que escrevo eu, sonhador de tantos rebanhos?Amai-vos aos poucos com letras de sangue nestas palavras lambidas que escorrem pelo poema. Estado liquido, lacre queimado em todas as vírgulas, seladas gota a gota neste bico de bunsen.
Tenho nas mãos a bíblia da sobrevivência avariada, uma chamada nunca atendida, suspensórios ilusórios e uma fisga sem pontaria, amiga da rota de colisão. Embrulho-me na razão excluída, no hat-trick fora de jogo com trivela mal parida, bandeira ferida e olhos aos molhos vendidos como couves na mercearia onde os nabos não conseguem sacudir a água do capote.Câmara retardada, lente constipada, transformadas em bolas de Berlim, percorrem ano após ano o santuário onde os anjos não querem dormir. Ok, Marta! Já o tenho seguro!
E caminho com um jerrican de 5 litros.
Desculpa, já não me porto como dantes.
Longos dias têm horas indecentes, marés estupidamente teimosas e sonhos banhados em canelas açucaradas. Triste tempero em algodão hidrófilo, só para afinar os ponteiros do relógio que fugiu daquela feira.
Impulsos sonolentos não acordam os obstruídos mentais.
A noite cai neste mundo desabrigado com vidas de partidas choradas.
De nada servem os poemas.
E arrependimentos como habitualmente
sem significado, devem ficar na tecla do voltar atrás, como é nossa usual conveniência.
Recostados no controle do saldo do cartão de crédito, amanhã iremos ser de certeza moderados no fútil consumo, respeitando assim um minuto de insolvência.


,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

TESE SEM ERROS

Amo-vos com toda a impossibilidade
que atormenta
este odor de axila quezilenta
onde afago os últimos beijos.
Sabor sem néctar,
num cheiro engarrafado
com angústias pregadas
nesta escada de cristal
pintada de abraços amolgados
pelo destino possível.
Talvez não seja errado,
agora dizer,
que o amor nem sempre é
uma tese sem erros,
e os exames que a consideram acessível,
mentiras escritas
nos livros com capa cor-de-rosa.




,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA

O ÚLTIMO BARCO

Todos a bordo!
Que não falte ninguém nesta partida,
nem as malas com memórias necessitadas do derradeiro afecto. Deixámos o cais que nunca foi viagem, e levámos nas mãos ouvidos com todas as saudades. Sorrimos para significados algemados, e no barulho do motor movido ao ritmo dos escravos, só queremos que a hélice não atraque nos nós que queremos queimar.
Que ninguém falte neste desenlace navegado com núpcias sorrateiras.
No último barco bocejam silêncios, ouvem-se os últimos olhares das ternuras despejadas que cantam o cansaço do sonho sempre longe de mais. Âncoras enferrujadas por tanta ausência cortam em tristes tiras, todo o optimismo que desprezámos. Esta é uma rota infeliz, cruzada pelo cântico das gaivotas obscenas, fartas do filme que estupidamente ensaiamos.
Este comandante é tão mentiroso como a estima que admitimos ter. Há sempre um mastro incendiado e um farol ocupado a enviar sms, actualizando as vagas do inferno.
Todos a bordo!
Que ninguém falte à chamada do baptistério.
Que ninguém falhe o gole sagrado de água parada da pia abismal.
Que ninguém fuja do necrotério enfeitado com lamentos despidos.
O último barco corre célere.
E nunca se cansa de nos levar.



,2017,mai_.aNTÓNIODEmIRANDA


terça-feira, 16 de maio de 2017

OS ÚLTIMOS POETAS

Jorradas no chão,
lambendo lâminas enrouquecidas,
as estrelas solitárias
no picnic dos anjos da boa vontade,
cantam só para mim prosas simpáticas.
E nos meio dos últimos poetas,
há um sax que grita
rejeitando toda a clemência.
E aparecem palavras que cortam,
e com este sangue abençoado,
serão escritos poemas
onde o tempo não pousa.
Continua o assassínio
nestas ruas envergonhadas,
de gente com alma
que só quer uma oportunidade.
E as feridas nunca serão curadas,
e os gritos arrumados no monte da ingratidão.
Sepulcros remexidos no meio de orações breves,
tão curtas como a circunstância
de só terem tentado viver.
E os últimos poetas
 soltam a poesia de todos os medos,
com todas as cores.
Na marcha fúnebre que os acompanha,
pensam com a esperança possível,
na sagrada indiferença
com que são considerados.
Os últimos poetas vão assim morrendo.
E mostram rosários
de nenhum arrependimento.





,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

NOTAS DO TEMPO DA CHUVA

Qualquer coisa que diga não quero que tenha o sabor da cantiga que constantemente ouço entoar. Estou cansado deste bater dos ponteiros que cilindram as horas vestidas de todos os significados. Excedo-me nas cordas da minha guitarra com a afinação que agora pretendo.
Os olhos desenham palavras que não sei escrever e o meu pensar é um realejo com notas do tempo da chuva.
Amoleço as ideias para um sono almejado que me acompanhe até voltar a ser meu. Abro a garrafa das possibilidades apetecíveis de um só trago bebo toda esta esperança.
Amanhã terá de ser tudo diferente.
 
,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA
 

CADA MINUTO EM QUE ME INVENTO

Cada minuto em que me invento,
pinto neste rodapé
asas do vento
e deslizo
sempre perto de mim.
Do navio perdi a âncora,
num qualquer coral de desânimo
onde não quero chorar
horas perdidas.
Solitário no desejo entontecido,
escrevo nas cordas desta harpa
manhãs de bruma
com caminhos sem volta.
Serei agora aquele,
que com a espada dos raios falhados,
acorda sempre antes do sonho.
Agarro sempre que posso
esta barca perdida,
e escrevo cântaros
cheios de versos amargos.
Cada minuto em que me escondo de mim,
dou luz ao farol,
abano um qualquer sos
sem sentido, ou rumo algum.
E estendido neste lençol
defraudado no oceano das angústias,
espero no desespero que não percebo,
uma rota diferente
e sobretudo com outros nós.
Em cada minuto em que me invento,
pinto neste rodapé
asas do vento
em que me escondo
sempre antes de mim.




,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

IDEIAS EM CONTRAMÃO

Os tempos estão a mudar!
Dizem os entendidos.
Não dão por ela os fodidos.
Os analistas sempre preocupados com a insensatez das suas teses, juram com pés de chumbo a cartilha da mentira.
Os jornalistas lêem cábulas mal escritas
e os cientistas enroscados na investigação,
olham de soslaio para a proveta em segunda mão.
Os assim , os opados e enrabados, conscienciosos, escrupulosos, publicitários anónimos e até aqueles que disto julgam que percebem,
confiam demasiado no electricista perito
na dissolução da energia estética.
Os tempos estão a mudar!
Não há relógio actual
que acerte estas horas
E você, sente-se bem?
Cuidado!
Não chegue atrasado,
ao festim das boas ideias
em contramão.
 




,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

CANÇÃO DO 1º DE MAIO

Roubam-te o pão no mísero salário.
És menos do que o chão
onde eles escarram
e a escória que continuam a querer que sejas.
E a vergonha com que atravessas a vida,
a fome sofrida
nesta ausência com todos os dias,
não é uma condição do destino,
que o patrão assassina
na gordura do seu extracto bancário.
Pobre de ti
de bandeira na mão!
Uma vez sim,
outras também não.
E a renda vazia,
e as horas sempre longas
e demasiado tristes
escondidas na persiana
onde rezas a desilusão.
Roubam-te tudo!
De ti e dos que agora não consegues olhar,
neste vazio só e frio
coberto com lágrimas
que pintam um muro
tão triste como o teu atributo.
Roubam-te tudo
Mesmo o que de ti já não há.

,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

MEMÓRIAS DE UMA BEATNIK

Eu e a Diane Di Prima
Num quarto escuro
E com a televisão apagada.
Não me lembro!
Será que foi mentira?
Queimámos artifícios de poemas,
e com a ajuda das barbas do Allen,
escalámos uma parede do Chelsea Hotel.
Lá para os lados de Brooklyn,
Timothy Leary procurava fósforos ungidos,
para aquecer a neve que lhe fugia dos pés.
Em Central Park,
esquilos simpáticos ofereciam rugas do velho jazz,
embrulhadas em papel de amendoim.
O sol acordou tarde naquele dia.
Tinha estado numa jam com Charlie Parker.
Eu e a Diane Di Prima
Num quarto escuro.
Há invenções
que me permitem
o sonho.



,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

MERKEL KUH HAND (mão de vaca)

merkel, és tão linda.
Perdoa-me a franqueza,
mas ainda mais bonito
era um míssil enfiado no teu ânus nuclear.
& uma bomba bem intencionada
poisada na tua vulva cabeluda,
seria um êxtase sublime
bebido no mais apetecido champanhe.
Gosto de ti assim,
escondendo nessas calças
o dildo com que fodes aqui a gente do sul.
Do teu penteado não ouso falar,
e admito pelas falas que não entendo,
que nem um blow job gelado,
poderia disfarçar,
a perícia
desse teu olhar,
de vaca mal parida.




,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

PROJECTO UNANIMEMENTE APROVADO

Havia naquela voz um prenúncio de anunciação.
Bem treinada,
oferecia um discurso ausente de dúvidas.
O ar prazenteiro,
a eloquência bem-parecida,
garantia eficazmente
uma resolução total.
Havia naquela voz uma serenidade à prova de bala,
e a sóbria atitude na arte de contar mentiras verdadeiras.
Lá no terreiro,
onde se malhavam os trigos da fome,
nada faltava.
E a vontade de comer
era somente uma coisa passageira.
Todos aplaudiam esta felicidade
perante o contentamento
da autoridade da protecção imbecil.
Até porque as obras da ampliação do cemitério,
avançavam de acordo com as perspectivas
mais optimistas
do projecto unanimemente aprovado.





,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

ESTEJAM ATENTOS!

Indo para baixo lentamente
numa difteria centrifugada
no tempo agora vivido,
cozinhado numa panóplia
que encurta a vida escrita
num pano-cru.
Velhos murmúrios
do metrómano ferrugento,
vagaroso e cansado
que me conforta com petits fours
tão fora de moda.
Paro no sinal vermelho,
abraçado ao stop amarelecido
pelo andar nebuloso
deste passar enlouquecido.
Aqueço a paciência
na garagem do frio
de quase todos os santos
e nesta fogueira de inverdades
assino de cruz
qualquer hipótese não consensual.
Inclino-me com todo o respeito
para o sentido proibido
obedecendo cegamente
a esta regra com ideias
em contramão.
Alguém ri do modo mais estranho,
enquanto a minha falta de interesse
é metida na reciclagem sem futuro.
Tenho uma bola de algodão doce
que me ergue as mãos
que com toda a vergonha,
sopram uma oração que não me pertence.
No paraíso dos distraídos,
ouço vozes tão distantes
como o fim em que me perco.
Velhas sintonias desenfreadas,
tentam mais uma vez simular
que o que é real também acontece.
E na novena Hip-Hop,
há quem estale os dedos
só para apagar velas com leds em 2ª mão.
Neste redil autenticado,
a contagem é automática,
e quem chega fora do prazo,
não é de confiar.
Apesar de tudo, publicita-se
que nuvens constipadas
irão sulfatar certas zonas
com prazeres livres de alguns pecados.
Estejam atentos!
Basta ligar para aquele
que nunca quis saber de vocês.


,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA


A DIVA DA MEIA-NOITE

A diva da meia-noite,
enroscada na echarpe
entornava o caldo da voz ensaiada
para mostrar que sabia de poesia.
Pobre poeta que tanto sofria,
naquele ronronar de gata fria
em telhados de zinco ferrugento.
E aquilo que se ouvia
era tudo menos o poema,
enquanto a lua borralheira
encenava um novo folclore
que ninguém entendia.
Estendidas no sofá da virtude adormecida,
a folha e a caneta desconfiavam
desta anomalia assim surgida.
O poeta na sua cara de silêncio entupido,
solta um mudo gemido
e um ai surdo nesta fala de absurdo
elegantemente pretendida.
E conversa animadamente
com o copo com vinho que o irá confortar.





,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

quinta-feira, 11 de maio de 2017

Jack Kerouac Blues and Haikus PART 1


OS ÚLTIMOS POETAS

Jorradas no chão,
lambendo lâminas enrouquecidas,
as estrelas solitárias

no picnic dos anjos da boa vontade,
cantam só para mim prosas simpáticas.
E nos meio dos últimos poetas
há um sax que grita
rejeitando toda a clemência.
E aparecem palavras que cortam
e com este sangue abençoado,
serão escritos poemas
onde o tempo não pousa.
Continua o assassínio
nestas ruas envergonhadas de gente com alma,
que só quer uma oportunidade.
E as feridas nunca serão curadas,
e os gritos arrumados no monte da ingratidão.
Sepulcros remexidos no meio de orações breves,
tão curtas como a circunstância
de só terem tentado viver.
E os últimos poetas soltam a poesia

de todos os medos,
com todas as cores.
Na marcha fúnebre que os acompanha,
pensam com a esperança possível,
na sagrada indiferença
com que são considerados.
Os últimos poetas vão assim morrendo.
E mostram rosários
de nenhum arrependimento
.


,2017mai,aNTÓNIODEmIRANDA

terça-feira, 9 de maio de 2017

Gimme Shelter 1969 - The Rolling Stone



BEAT
(Com um abraço para o Miguel Martins)

Ginsberg!
Na américa nada mudou!
Apesar dos teus avisos e das mil profecias que lhe entregaste.
Tudo continua ridículo no país que tanto te ofendeu.
Corso continua à deriva na procura desvairada tentando encontrar uma plantação digna da sua generosidade.
Snyder deixou de ser um monge respeitado mesmo não tendo corrido bem a impressão de haikus na reader's digest.
Diane di Prima e as suas longilíneas meias de vidro enforcam agora as memórias da beat com “mais ou menos poemas de amor”.
Ferlinghetti tenta fazer o que pode emoldurando “os dias tranquilos”.
E eu próprio para lá caminho.
Allen, tenho todos os seus poemas guardados num saco cama sempre pronto a desafiar-me.
Continuo a entrar nos supermercados sem que alguém reze pela minha beleza.
Compro assim o que falta usando um cartão de crédito made in china.
Pago as contas com euros sediados num off shore que continua a fazer-me a vida ainda mais preta.
Nas ruas vejo tantas pessoas deitadas ao lado dos contentores do lixo que comem depois dos ratos saciarem o apetite.
Ginsberg, a américa está como sempre perigosamente parecida com o outro mundo.
E isso e os russos ainda o tornam pior.
Ginsberg, toda a gente escreve palavras numa articulada mania que dizem ser poesia.
Aprenderam nos compêndios que lhes oferecem doutoramentos tirados nas máquinas das fotografias onde perdemos a identidade.
Allen, morre-se assim sem dar por ela, embora ninguém vá ao seu funeral.
Nunca estive na City Lights mas quando lá chegar serei imediatamente cumprimentado pelo Lawrence.
O mundo continua a fugir do meu sonho e desatento como é, tenta polvilhar os seus poemas como se isso pagasse o respeito que nunca mostraram.
O Carrol já não tem saudades do pai e ocupa agora os feriados entregando porta a porta embalagens de poesia sem consignação.
Ginsberg, este universo é cruel apesar de tudo o que tenho oferecido
Tenho a uretra infectada com pus e uma fricção contagiosa que me controla a alma e o Robert Saggese tem “um pássaro na palavra” e está demasiado esquecido para a salvar.
Allen, tomam conta de mim agora anjos que nunca pedi.
E fazem picnics no Central Park com a bandeira do goldman sachs estendida e olham de soslaio todas as minhas expectativas.
Ouço em semitom a música das sirenes que encharcam a minha ruína e Frank O´Hara continua preocupado com “a crise da indústria cinematográfica”.
Morre-se em qualquer lugar sem hora combinada sem culpa formada e sempre nos apanham desprevenidos e esta é “a proposta imoral” escrita por Robert Creeley.
Allen, a vida é o cemitério do medo com orações take away gravadas em lápides onde se mente aqui jazz um homem bom.
A melancolia cega a beleza dos meus olhos perdidos de volta no espelho, onde costumava ver-me enferrujado como os nós do arame farpado, pejado de retratos desconhecidos balançando uma “melodia para homens casados” gingada nas ancas da Lenore Kandel.
E a noite chega atrapalhando o festim do fim do mundo, que acontece todos os dias em que não somos capazes de nascer. E Ron Loewinsohn continua a gritar “contra os silêncios que estão para vir”.
Allen, sou observado por um drone não identificado e só tento esconder a denúncia nas folhas que guardo num mealheiro que roubei na igreja dos últimos dias dos santos sem piedade.
Estou farto de ver gente feliz sem qualquer motivo e com orgulho menstruado pela miséria que espalham.
Mas este passadiço não tem limite e eu acabo por adormecer sempre com a estrela errada na cabeça.
Koller tenta acalmar-me oferecendo um tapete de “ossos & penas Pele e Asas no chão”.
Allen, preciso de uma ligação pré-paga para o paraíso artificial.
Pretendo pedir asilo temporário para a minha solidão. Mas ninguém se interessa pelo meu horário, embora ele não tenha os dias sempre tristes.
Allen, estive numa concentração budista em que um monge flipado danificou o meu drama.
Frequentei aulas de yoga com uma bailarina atenciosa que só bebia iogurtes fora de prazo.
E até deus sabia o quanto eu detesto esta forma de orientação.
E assim fui até ao fim do mundo ainda com um fardo mais pesado.
Perco-me no significado das eloquências mal frequentadas que mais parecem elogios fúnebres acompanhados pela dança de carpideiras hawaianas, que me puseram no pescoço um colar de flores putrefactas e agora entretenho-me nas horas de ponta a espalhar o seu perfume nos urinóis mais utilizados pela opinião pública.
Tenho uma postura sisuda e nada simpática para não me confundirem com o namorado da barbie.
Volto ao lugar para ouvir o discurso do velho corvo de asas metalizadas e língua prenhe da única sabedoria. Fala-me do degelo da humanidade e dos medos que tanto a ferem.
Então digo-lhe que estou pronto.
Eu sei que ele me levará aos demónios.
Allen, não quero este caminho que a solidão comodamente instalada no sofá pensa cativar-me.
Actualizo-me num sequestro sereno na chegada do momento de abraçar manuscritos pacientes que decoram as sombras do silêncio numa modernidade de estátuas com olhares distantes.
Este universo é cruel apesar de tudo o que tenho tentado.
Estou cansado de esperar nas escadas do paraíso com a chave errada.
Tenho uma coleira certificada, anti tudo mas que não funciona.
Tomam conta de mim agora poetas tão tesos como eu. E afiam no nobre golpe da navalha a memória enlouquecida
Aparo pétalas demasiado parecidas com gotas de sangue.
Já não penso no que teria ter sido nem nos milagres que tentavam vender-me na feira das onze dos domingos.
Aplainei virtudes diferentes nos anos que só a mim pertenceram e alinhei nas propostas condizentes com a minha pretensão.
Colhi nesta estrada frutos nunca imaginados por quem de mim só pensou o que não me conhecia.
Continuo um curioso sem complexos o que me torna um aprendiz interessado.
Ginsberg!
Também tenho um grito!
E um frio tremor nas mãos que me tempera angústias desesperadamente sós.
Ginsberg!
O mundo nunca vai encontrar o caminho.


2016,09aNTÓNIODEmIRANDA



 

sábado, 6 de maio de 2017

FEIRA

Cavaleiro especial levando a esta feira
encruzilhadas em 2ª mão.
Não se deve discutir o preço ...

quando a intenção é pequena.
Sou um vendedor sem templo
carrego sonhos fora de prazo
e ofereço garantias inúteis
dispostas numa bandeja sem fundo.
Alinho laços para enfeitar bouquets
pendurados num wi-fi.
Não quero discutir o tempo da pretensa bondade.
Não há fios para a atar.
Contemplemos sentados numa maneira qualquer
um haiku lido com todas as letras do arco-íris.
Nunca sejamos pacíficos
e não vale aceitar de ânimo leve
qualquer coisa que não nos interesse.
Há punhais disponíveis
e sempre ávidos para sangrar
toda a não sagrada complacência.
Núpcias incendiadas,
valquírias que fugiram da ópera
e parceiros comerciais movidos a banha da cobra,
com manuais mal intencionados.
Há artefactos sem natureza de facto,
alinhavados em candeeiros incólumes
ao nosso altruismo.
Remar remar devagar
para não se chegar a pressa nenhuma.
Não há qualquer largo que nos abrigue.
Estamos na autogestão da estupidez generalizada.
Tudo é normal.
Gememos a pequenez dos nossos atributos.
Santificado seja aquele que vos ignora.



,2016,05.aNTÓNIODEmIRANDA