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quinta-feira, 20 de outubro de 2016

SAL!

Sal!
Incendiando-me as teias , chorar nas veias e esconder-

me na sarjeta da tua saia.
Vale o que vale, até porque tu continuas a não saber o

fel deste meu gosto que está à venda no mini mercado
mais perto de ti.
Porque será que me custam a respirar as palavras

que nunca entendes?
Não é a má vontade do meu desinteresse, até porque

me cansei de ser santo, naquela vocação que me
abrandava os joelhos na inglória e exacta hora, em que
todas as orações eram tão sujas como o nosso
não acontecer.
Matei-me tantas vezes no chão numa espera sempre

crescente onde só cabiam ausências indignas.
Atropelei-me queimando uma pele cansada da falta de

confortos e viciei-me em oráculos venenosos.
Ninguém me ajuda a pegar neste andor com resumos de

todas as vontades contrafeitas, pregados numa cruz encristada
de pecados que não são os meus.
Sal queimado na fogueira dos abrenúncios,

coados nas ternuras sem sinónimos,
onde lamentos acachapados escorriam de uma barrela
embutida nas paletes do desespero silicamente conservado.
E a morte empalada em todas as horas do tempo que recuso viver.
Por muito que me digam que gostavam de ser assim,

só porque não gosto de segundas vias,
prometo-vos que Isto dá-me mais canseira do que o trabalho.
Até porque a vida é uma cópula institucional que não respeita a idade.
Eu me saúdo no centro mundial da identidade adulterada

e aguardo angústias disfarçadas de anjos maus
contemplando o tempo que não me presta.
Alguém que me salve sem desgosto.
Sal!
Incendiando-me as telas que eu continuo a rasgar

com sopros que me esburacam a algibeira.
E eu envolto no sal, pilhando nenúfares ao Monet

do meu mar tão desassossegado.
Sal e mais sal!
Que ilha ainda me restará?
Tenho uma sensação necrológica necessitada de uma operação urgente.

E falta-me paciência para preencher o formulário da fila de espera..
Reclamo o meu desespero embora saiba que ele continuará a ocupar

um vão de escada onde choram outros sem abrigo.
Ai de mim, ferozmente assado neste sal.
Estou cansado de secar lágrimas num varal onde pousam

imagens que já não sei retocar.
Sal no guisado amargo da minha vida,

demasiadas vezes gasta na vã ambição de cortejar
a inquietude em tons diferentes.
Descontinuo-me escrevendo num moral anónimo

 liturgias desequilibradas.
Sal!
Incendiando-me as veias, entupindo as teias da solidão

que dorme no meu porta bagagens..
Por favor, avisem quem me espera no cais

que não encontro para atracar.
Sabes quem és?
A puta submissa da constante violação.


2016,10aNTÓNIODEmIRANDA

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