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terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

PAULO LEMINSKY - 1944 | 1989

soprando esse bambu
só tiro
o que lhe deu o vento

confira
tudo que respira
conspira

duas folhas na sandália
o outono
também quer andar


a palmeira estremece
palmas pra ela
que ela merece

passa e volta
a cada gole
uma revolta

bateu na patente
batata
tem gente


verde a árvore caída
vira amarelo
a última vez na vida


nada me demove
ainda vou ser o pai
dos irmãos karamazov

na rua
sem resistir
me chamam
torno a existir

debruçado num buraco
vendo o vazio
ir e vir

casa com cachorro brabo
meu anjo da guarda
abana o rabo

cabelos que me caem
em cada um
mil anos de haikai

as folhas tantas
o outono
nem sabe a quantas

a chuva vem de cima
correm
como se viesse atrás

amei em cheio
meio amei-o
meio não amei-o


pelos caminhos que ando
um dia vai ser
só não sei quando

meio dia três cores
eu disse vento
e caíram todas as flores

abrindo um antigo caderno
foi que eu descobri
antigamente eu era eterno

o mar o azul o sábado
liguei pro céu
mas dava sempre ocupado

primeiro frio do ano
fui feliz
se não me engano

ano novo
anos buscando
um ânimo novo

cortinas de seda
o vento entra
sem pedir licença

lua à vista
brilhavas assim
sobre auschwitz?

tudo dito,
nada feito,
fito e deito

tarde de vento
até as árvores
querem vir pra dentro

tudo claro
ainda não era o dia
era apenas o raio

essa vida é uma viagem
pena eu estar
só de passagem

longo o caminho
até uma flor
só de espinho

nadando num mar de gente
deixei lá atrás
meu passo à frente

noite alta lua baixa
pergunte ao sapo
o que ele coaxa

nu como um grego
ouço um músico negro
e me desagrego

a noite - enorme
tudo dorme
menos teu nome


tatami-o ou deite-o

de colchão em colchão
chego à conclusão
meu lar é no chão

madrugada bar aberto
deve haver algum engano
por perto

acabou a farra
formigas mascam
restos da cigarra

minha alma breve breve
o elemento mais leve
da tabela de mendeleiev

essa ideia
ninguém me tira
matéria é mentira

jardim da minha amiga
todo mundo feliz
até a formiga

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