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segunda-feira, 30 de junho de 2025

LISBOA & TUDO ISSO...


 Porque não tenho jeito para a saudade.
Nunca me cansei de calcar aquelas ruas durante mais de 20 anos.
Deixem estar o menino. Ele está a escrever os seus poemas. E eu sentado com a velha Messa ouvia contente o cuidado do meu chefe.
1. Ataque epiléptico
Espumava deitado no passeio um coro de insultos merda de bêbado
2. Custódio Cardoso Pereira
Rua do Carmo
Ponto de encontro. Músicos.
3. Au Bonheur des Dames
Elas ofereciam-me amostras de perfumes e admiravam a minha preferência pelo “”.
4. Arnaldo Ferreira o pintor da noite.
Bulia a Rua do Carmo apressando palavras num discurso freneticamente revoltado.
5. Dali o bailarino de tangos e o seu inconfundível bigode. Dançava com uma pantufa enfiada no pé direito, em frente da Discoteca Universal, as canções escolhidas pelo Zé Augusto.
6. Os gins no bar dos Armazéns do Chiado
abundantemente servidos pela Teresa e João.
7. Ritz Clube
A velha banda. A streaper Dina da Conceição conceituada bailarina afro-cubana, 60 anos ou mais. As senhoras de lenço na cabeça e óculos escuros em formato de gata, (como nos filmes italianos), e as suas histórias. O whisky sem marca.
8.Guarda Nocturno
Mijar na rua da Vitória com uma pistola apontada à cabeça
9. Salsaparrilha e whisky em copos pequenos. Não sabíamos nada acerca dos shots.
10. Comodoro & Eduardo 
Tinha um gozo especial quando ao jantar bebia o whisky de alguns directores do JBF que frequentavam assiduamente o rés-do-chão, onde as meninas como quem não quer a coisa, mostravam as cuecas.
11. Os sapatos da Hélio
Cheguei a ter 23 pares. Alguns feitos de encomenda. Tinha uma actividade profissional paralela: revendedor não oficialmente autorizado.
12. Os pastéis de bacalhau no Palmeiras
Geralmente por volta das 4 e meia da tarde. O tinto era da Labrugeira.
13. As idas aos CTT da Praça do Comércio
O regresso contemplava invariavelmente a visita ao Escondidinho da travessa do Cotovelo e uma breve passagem pelo Galego da rua do Crucifixo. Sempre na companhia do Ti Luís ou do Tio Xico.
14.Notário
Reconhecimento de assinaturas. Uma ou outras por mim imitadas. Consegui ganhar uma aposta ao meu chefe.
15. A Brasileira
Não sei porquê, mas tinha o hábito de esconder a colher do café na minha cabeleira. Mais tarde tive algum sucesso quando a oferecia em forma de pulseira às minhas amigas.
15. A _ Jornal República 
15 de Novembro de 1972 . Lembro-me perfeitamente das palavras do Dr. Raul Rego: rapaz, vais ter o primeiro desgosto como jornalista: dou-te os parabéns pelo artigo, mas isto vai ficar um quadradinho.
15. B _ Livraria Buenos Aires
Rua de Buenos Aires, 7 B (Lapa) Lisboa Anos 70. A Livraria do meu pai, Abílio de Miranda com a preciosa colaboração do meu irmão Tomás de Miranda. Foi aqui que começou esta mania. Com a sua inestimável ajuda e constante incentivo. Comprava os livros às prestações e sem quaisquer descontos. O dinheiro fazia falta lá em casa. Assim iniciei a minha viagem.
 Um obrigado muito abraçado.
16. Opinião
Sempre diferente. Passei grandes momentos ouvindo os Senhores Raúl Rego, Álvaro Guerra e Baptista Bastos. O Hipólito mostrava-me sempre aquilo que eu gostava. Livros & Lp`s.
17. Livraria Ferin
Alimentava a minha paixão pelos Índios da América do Norte, comprando às prestações, livros importados.
18.Tabacaria do Rossio
Esperava ansiosamente o final do mês para ter nas mãos a Rock&Folk. Anos e anos a manter esta satisfação.
19.Sapataria Presidente
Fiquei doido com os meus primeiros Lótus. Eram feitos à mão. O senhor João Baptista Fernandes apreciou o meu bom gosto.
20. Livraria Bertrand
Cumprimentava sempre o senhor Luís. Um velho amigo do meu pai. Depois entrava no mundo que aprendi a respeitar. 
21. Livraria Sá da Costa 
Um prazer à mão de semear.
22. Livraria Portugal
Visita obrigatória à minha amiga Isabel.
23. Livraria Lello 
Nunca consegui resistir ao seu perfume.
24. O cretino do BESCL
Rua nova do Almada. Todos os dias a caminho do emprego, este imbecil manhoso e não engraçado, divertia as colegas com as bocas que me mandava.
Nunca mudei de caminho, e um dia cara a cara com o cretino, prometi solenemente que mais tarde ou mais cedo, lhe partiria a tromba. Por mim, até podia ser naquela altura. Continuei a descer aquela rua e nunca respondi ao bom dia com que ele julgava insultar-me.
25. Banco Borges & Irmão
Praça do Município.
Era aí que ia levantar os ordenados dos colegas da minha secção.
Vi um dia o senhor Pedro Homem de Melo a vender livros. Até então só o conhecia da televisão. Não tive vergonha, falámos e comprei um, que as gorjetas acabaram por pagar.
26. O Barbeiro da rua do Arsenal
Às 4ªs Feiras pela manhã ia lá buscar o Senhor António Baptista Fernandes. Água de cheiro e raminho de alecrim na lapela. O barbeiro saudava-me cordialmente e nunca mostrou qualquer desagrado com a minha farta cabeleira. Começávamos pela loja para cumprimentar o pessoal, mas era no escritório que os olhos deste velho senhor, brilhavam de maneira marota quando demoradamente apertava as mãos das minhas colegas.
Depois, sentado no velho cadeirão de couro, acabava por adormecer.
27. Pastelaria Ferrari
Os bolos preferidos das minhas colegas grávidas.
Quando ficava contrariado, acabava de meter o “duchesse” embrulhado debaixo das axilas. Nunca nenhuma se queixou.
28. Pastelaria Central da Baixa
Lembro-me do Bolo-rei. A minha mãe era fã.
  29. Manuel Careca “Limonadas”
Cenas do Pátio das Cantigas ao vivo. E a limonada bebida nos intervalos de uma bola de Berlim, até caía bem.
30. Casa da Sorte
Eram lá que ia buscar as cautelas do senhor Joaquim Nunes Figueiredo. Diziam que era o meu padrinho e isso permitia-me um estatuto especial dentro da empresa. Ofereceu-me vinte contos como prenda de casamento. Uma vez, quando me deu boleia até à casa da minha namorada, disse-me que me ia pôr bem na vida. Passados oito dias, abraçou-me dizendo que não voltaria. Lembro-me de entregas de presentes às suas conhecidas, feitas de um modo discreto.
31. Beat Club
Boa música mas demasiados betos para o meu gosto.
32. Brown`s
Punk em Lisboa.
33. RRV - Rock Rendez Vous
Era amigo do Mário Guia, o dono. Estive na inauguração. Jamais esquecerei aquele concerto do Wilko Johnson.
34. Hot Club
Grandes Músicos para uma música que me apetecia.
35. Quarteto
Saudades do cinema a sério.
36.Cervejaria Trindade
No tempo em que as batatas fritas ainda vinham com bocados de casca. E aquele gajo que só bebia garrafas de litro da cerveja preta Sagres.
37. A tasca do Tony Morgan – Bº. Alto
Sempre que lá estive, senti um carinho especial do Tony.
Ouvia-se fado e entornávamos jarros de tinto acompanhado com caldo verde e chouriço assado.
38. Casa Batalha – R. Nova do Almada
Agradeci sempre a preciosa ajuda da senhora Noémia na selecção das pedras para os 12 colares que usava naquela altura.
39. Rua das Trinas – Estúdio do Jorge Monteiro
 Uma ou duas vezes por semana, ensaiávamos com o António Variações. Janeiro a Junho. Ano 1981.
 Anos mais tarde, um conhecido radialista classificou-nos como a pior banda de garagem que já tinha ouvido. Orgulho.


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domingo, 29 de junho de 2025

SEXO TÉTRICO

Ligaram o micro ondas para aquecer a libido.
Colocaram o cd meticulosamente escolhido
e ouviram o mantra indicado.

Desnudaram os complexos,
abraçaram a intenção,
estenderam o karma,
comtemplaram-se de frente um para o outro.

… Mas era do apartamento ao lado
que vinham sons de uma profícua actividade sexual.

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PIAF

 


Lia-me um poema ao contrário e soletrava letra a letra a teoria da ascensão cósmica no universo uno e transcendental. Continuava admirado por todas as vezes que esteve na Trocadero de Paris, ninguém parou para o medir. Falei da "metatísica" , da importância do "photomaton" da insegurança "fotodiária" e da futura rendição incondicional de todos os deuses ainda não arrependidos. Pois, mas as molduras atraiçoam muitas telas. Não consegui explicar que a intenção não era má. Nem você é bom, respondeu. Não tinha um prego. Não pude virar o bico. Lá mais adiante, um bando de cretinos impregnados de smart camera, tentava pintar o Sena. Mas, este é o rio dos poetas que chora uma música que só eles podem beijar. 
Tenho nos ouvidos um segredo que a Edith me vai cantar.
Estendi o saco cama e adormeci com a navalha na mão.




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SIMPLESMENTE...


 

A ÚLTIMA NOITE

 


Sentado numa poeirenta poltrona de cabedal 
a imitar napa, lia jornais atrasados com notícias 
da última hora. 
A melancolia cheirava a loção de barbeiro, 
a pele tingida com cor de shopping
iluminava a calma de um sol desanimado. 
Bebia aquele silêncio morto com passos ocos, 
que enchiam os corredores encharcados de lixívia. 
Sonhos mudos embalados em cartão, 
retardando a lentidão da solicitude 
de uma vontade há muito tempo escapada. 
Chovia sempre que escolhia aquele caminho, 
onde pássaros atrasados buscavam o ninho. 
Rasgava com toda a raiva poemas, e
nquanto ouvia Leadbelly cantar:
my girl, my girl, don´t lie to me”.
E dizia para si próprio: 
também não quero saber, 
onde ela passou a última noite.
O musgo dormia abençoadamente na lareira.


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E ADORMECIA …

 


Limpava alguns momentos à procura  de boas notícias na página da necrologia do jornal pousado na mesa do café e invariavelmente discutia a desilusão com o barbeiro.
Depois seguia até à paragem da camioneta que religiosamente tinha partido às sete da manhã. E esperava pelo carro do peixeiro, sempre com a esperança de um atraso que era raro acontecer.
Dava um pulo à horta para regar os tomates, e encostado ao muro habitual, contava vagarosamente as badaladas do sino da igreja, não que tivesse interesse, mas podia ser que desta vez elas não sincronizassem com o relógio que tinha comprado na loja do chinês.
Tinha saudades da cavaqueira da feira, mas agora está tudo tão fraco e longe, mais longe, do que o tempo que tem para gastar. Chegava a casa e ligava a televisão e telefonava para o número mágico que lhe prometia um prémio de não deitar fora. Quando fosse á cidade, haveria de comprar um telemóvel novo. O seu só funcionava para chamadas sem ofertas. Além disso queria fazer boa figura quando fosse à festa da aldeia. E continuava a cismar com a mania de pôr a mota em cima da mesa do snooker. Claro que gostava muito dela e aos poucos foi perdendo a saudade do ribombar das bolas. E o canito já estava velho para as apanhar.
Não ia para a cama sem visitar a adega, agora que não podia beber nem vinho nem aguardente que teimava em fazer. Talvez alguém apareça hoje e lhe dê dois dedos de conversa. Não será pedir muito. 
E adormecia ...


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sábado, 28 de junho de 2025

POEIRA

Toma o tempo que precisares          
Agarra-o como quiseres        
Rejeita a fila                       recusa a tua vez         
Falha o necessário                          Tu és o essencial       
Corta a curva           Não fiques na encruzilhada    
Voa até o chão deixar de ser teu       
Sacode a poeira

Vai!      
Mas desta vez, até ao fim.

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quinta-feira, 26 de junho de 2025

ASSOBIA O VENTO O FUMO QUE ME SANTIFICOU

 


Apenas 

Deitado

Não 

Sei 

Sossego 

Que 

Me 

Espera 



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DIZEM OS ANTAGÓNICOS

 


ESPERANÇAS DE ESPUMA




Tudo foge naquilo que me acontece.
Nada consigo apanhar neste jogo de anões ambulantes.
Lembro uma escada que levava o cansaço para outros bocejos.
Lágrimas beijavam ombros.
Não sei se seriam os meus.
Outros lugares,
Possivelmente
Irão
Anoitecer.
Desejo arduamente
Uma noite sem grãos de
Lua.
Um colchão sem esperanças de
Espuma.
Um deslizar sem aviso
Prévio.


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segunda-feira, 23 de junho de 2025

SANTUS TIPU PUPOLARES

 


St. António já se emvevedou

S. Pedro está a gomitar

S. João agarrado au valão,

pedrado até mais não,

pensa que bai boar.

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EU UM DIA

 


Não sou fronteira de nada
De qualquer maneira,
Não é o meu ser
Fogueira apagada
Não sei que fogo
Me deixou de arder
Apenas sou eu
De mim próprio
Sem sim
Eu
Viagem ainda não começada
Com bilhete de ida
Sem volta anunciada
Eu não melhor que nada 
Eu um dia
Para acontecer.


_2014_aNTÓNIODEmIRANDA
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CASACO ENCASPADO


Desculpem a interrupção: 
A estupidez segue dentro de momentos.
Combata as rugas na boutique do tempo,
onde se vendem relógios mentirosos.
Cocktail generoso.
Croquetes deliciosos.
Na academia das águas livres de tudo aquilo que nos possa fazer bem.
Assim, não vais longe, 
dizem os imbecis que têm na distância 
a única certeza adquirida.
Tenho percorrido muitos dos caminhos 
que me proponho, 
pisado pedras, cantado algumas solidões,
saboreado todas as indecisões.
Mas no meu filme sou sempre o actor principal.
A liberdade não é um acessório.
Saída de emergência.
Informações úteis sobre a validação
da sua não identidade.
Gerir contrato
Não fumadores de quê?
Cuidados intensivos.
Cadilhos paliativos.
Memórias cremadas.
Corpos cromados
Código pessoal.
Gerente de conta.
Caixa geral de consensos.
O rendimento voltou.
Gestor da vontade.
Encruzilhada semaforizada.
Trabalho ocasional.
Acção temporariamente só.
Arrendamento
Parqueamento
O presente perfeito
Oferta demolidora
Quanto tempo falta?
Mude de perspectiva.
Congresso nacional dos mamadores.
Convenção anû(s)al dos enganadores.
Curva perigosa.
Rua sem saída.
Trânsito condicionado.
Casaco encaspado.
Contracção.
Comichão.
Infecção.
Comissão.
Dilatação. 
Degustação de pecados no céu.
O convite está feito!
Apareçam sem eu dar por ela.


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A-TENSSSSSSÃO

 


HORÓSCOPO

 



Nada me satisfaz neste rosário de lesmas 
agarrado às minhas voltas.
 Não consigo achar o sentido da beleza, 
perco-me em divagações malparidas, 
escondo-me nos fumos dos cigarros, 
neste encontro sem chegada. 
Jogo às mentiras, 
detesto a paciência e a sua inútil calma, 
atiro sorrisos enganados para a parede. 
Tenho na garganta 4 tiros amestrados, 
uma fogueira de hipóteses queimadas, 
um manual de soluções fora de prazo.
Agradeço ao tempo, 
a conta desigual com que nos aturamos. 
Neste lapso do amigável engano, 
risco do horóscopo as possibilidades fictícias. 





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NO DOCE BARAÇO DA SORTE

 




domingo, 22 de junho de 2025

MISE-EN-SCÈNE



Era para ser como no cinema 
mas o filme não esperou por nós

Sentado na ausência do sonho
o realizador fugiu para outro casting

A cadeira deslizou em câmara ardente 
à procura do argumento


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SUAVE DEITAR

 


Fogem as memórias.
Só me lembro dos dias perfeitos e dos 
tropeções que não me deixaram cair.
Laço de angústias a tentar naufragar no lago 
dos desesperos onde cisnes alucinados 
queimam as asas do prazer.
Azarados fantasmas ensaiam 
num “FUNKIE TANKYE” apressado, 
a chegada da legião da boa vontade à terra.
Deus não meu!
Porque Teimosa-Mente ainda pretendes 
vender o paraíso errado?
(adoras o beijo da Kalashnikov).
Não, o erro nunca será meu!
Jamais pretendi ser a merda de um soldado!
Fogem as memórias num bailado 
que não entendo. 
Dança esquisita esta que escorrega 
entre os medos que me querem entregar.
Serei eu? 
Ou aquele que agora me pede incessantemente 
para não ir?
Baby please don`t go”.
Desejo que me guies até ao suave deitar.
(guarda este sonho no som 
mesmo 
roufenho da ferrugenta harmónica).
Depois deita-te fora de mim 
e afoga esta salada de martírios.
Pinta outro céu na cama da flor da fantasia.



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sexta-feira, 20 de junho de 2025

AMADORA CITY BLUES _anos 70

 



                                            Ainda sou do tempo em que as irmãs dos amigos eram intocáveis.

À sexta-feira íamos até á Damaia para a sessão de terror no cinema D. João V.
No “Recreios da Amadora”, (o piolho), víamos grandes filmes acompanhados por simpáticos charros. 
Naquele tempo o cinema era acolhedor.
Na Brasileira do Chiado era normal esconder no cabelo a colher da bica (mais tarde transformada em pulseira), ou até um simples pires.
Aos Sábados, (que gloriosas noites) embebedava-nos na “Nau”, e para acalmar o stress, partia alguns copos de imperial com os dentes. 
Era frequente pôr um ou outro empolgado “madié” a contar os buracos da rede de pesca pendurada no tecto da cervejaria. Bastava pronunciar a palavra mágica “Ai-Xi-Kúrú. A bem da verdade ainda hoje não descobri o seu significado.
Em Agosto, aparecia o Jimmy com o seu capote alentejano, e o tal lenço que glorificava a sua trunfa. A colecção dos meus colares assim como a guedelha com alguns anos de existência, acompanhada pelo cumprimento de um amigo (2 cintos, suspensórios e luvas de cabedal), apreciavam este tipo de ocorrências. 
Inundávamos o jardim Delfim Guimarães com pétalas de bem-querer.

                                    Ainda sou do tempo em que as irmãs dos amigos eram intocáveis.

No “convívio” jogávamos matrecos e vendíamos bicos de lápis de cor devidamente embrulhados em fita-cola como se fossem ácidos. 
Com o pecúlio apurado organizávamos bacanais de bitoque na Minabela da Mina. O Ilídio era um ás a descongelar garrafas de Gatão.
Nas matinés do Pigalle (o nosso café preferido) para além de azucrinar a cabeça ao Barnabé, assim que notávamos um olhar curioso, aproveitávamos para depositar macacos do nariz nos pires do café. Também era frequente o impedimento da nossa presença, por comportamentos não adequados. Isto na óptica do gerente. O Alves, a quem amorosamente tratava-mos por zarolho.
Na Ninfa, aparecíamos nas tardes de domingo para beber carioca de limão com 2 pedras de gelo.
Algumas vezes íamos em digressão até ao “Quartier Latin”, um bar na Óscar Monteiro Torres. Gente boa, e uma tal Lena Águas atendia-nos com uma sorridente simpatia.
Nunca falhamos uma rusga da polícia. (Ocorrência habitual nas noites de Sábado).
E bem pedrados, derrotámos num improvável jogo de futebol, uma das turmas do liceu. (a nossa equipa, um misto de gajos e raparigas, era praticamente intragável). 

                            Ainda sou do tempo em que as irmãs dos amigos eram intocáveis. 

E, com toda a educação, tinham a nossa companhia até às portas das suas casas.


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quinta-feira, 19 de junho de 2025

VISITO-ME SEM QUERER

 


        Guarda-me a 

Noite


        Hoje não 

        Quero 

        Repetir o 

        Amanhã


                Visito-me 

sem         Querer

Bastas 

vezes 

Melhor 

seria outro 

Desejar






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quarta-feira, 18 de junho de 2025

BOULEVARD DA DESILUSÃO

 







HAUTE COIFFURE

 


A tinta já nada pintava
e a laca hemodinâmica não fazia efeito.
Dizia a madame com a touca enfiada:
desta vez quero uma coisa diferente:
madeixas a condizer com a minha imbecilidade:
dê-me um retoque nas rugas
não vão elas mostrar a minha idade
Garra afiada
manicura à la carte,
recostada,
ouviam-na com a suposta atenção,
enquanto lhe limavam os cascos
e aparavam a crina.
Riam-se surdamente:
Meu deus, que falta de gente.


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QUANDO O SILÊNCIO CHORA

 


Quando se vive a enxotar o 

Tempo

Quantas vidas

Morremos?



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terça-feira, 17 de junho de 2025

COLTRANE

 


Dança no sax um fado triste, 
uma ausência constante naquele olhar
 que só as estrelas podem molhar. 
As mãos afagam delírios 
que unicamente lhe pertencem. 
Nas esquinas que o conduzem 
a nenhum dos lugares, 
há um som escondido n
o caminhar para o crepúsculo 
dos deuses com alma. 
No riscado LP, escovo para a memória, 
um pó sagrado.
Gosto!


2019jun_aNTÓNIODEmIRANDA



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CREPÚSCULO INEVITÁVEL

 


Guardas o silêncio deste nome descarnado, 
na lâmina que pune a ferida da hora quebrada.
Está frio,
e cada vez mais vazio,
o sonho antigo.
Envelhecemos acidamente de mãos enrugadas, 
sempre à espera do guarda-joias da esperança tardia.
E no meio do solo do Coltrane que nos abraça,
 apertamos memórias escondidas na algibeira.
O resto,
que de nós se vai afastando,
permanecerá intacto.
Celebramos  o contrário dos dias,
para que a velhice não nos cace,
antes do crepúsculo inevitável.


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ADEUS DETINHA, VOU-TE COMER

 


És boa de qualquer maneira.

Mas, confesso

...

não resisto ao grelo salteado.

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OBITUÁRIO (para o António da praia de Melides)

 


O que faço com esta memória empoeirada, que esconde no silêncio envergonhado, os recados que me arredam de ti?
Podemos imaginar qualquer coisa, mas o importante continua a não acontecer. Voamos no meio de papéis facilmente queimados pelo sol. Fogem dos ombros, com uma pressa inchada, as palavras que pensávamos, nunca nos iriam mentir. Dormem escondidas, numa lua amachucada pelos dias do futuro. Que lugar estranho este, que já não reconhece o nosso bafo, nem a triste melodia que nos aproxima do fim. Como se a morte fosse uma coisa esquisita. 
Estes monstros não deviam estar no nosso filme.
Conversa triste, como o aviso para que não apertasse as tuas mãos inchadas, e aquela frase terrível que estavas a morrer. 
Estou farto do sabor deste cansaço. Deste brilho escuro que não me deixa dormir. Deste espelho mentiroso que só oferece brilhos de raiva pintados com as cores de todos os medos.
Declaro com a urgência da brevidade de continuar a fintar todo o contrário que me é proposto, que o obituário está temporariamente suspenso. 


Melides, 2019jul_aNTÓNIODEmIRANDA
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segunda-feira, 16 de junho de 2025

PARAÍSO TATUADO

 


Tranquilamente sentado 
no alforge da memória
agarro na caneta 
e proíbo-a de inquietar 
a minha incoerência


Não foi para isto que a bondade 
me botou no mundo






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POR VEZES MENOS SÃO MAIS DO QUE MUITOS

 



Algumas 

Perspicácias 

Mentem 

Mais

Do 

Que

Maior ~

Das 

Falácias



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O ESPANTA PATOS

 
Sempre que metia o instrumento à boca 
fazia lembrar um pudim flan instantâneo 
desesperadamente afogado 
numa caixa de sapatos.
 
Um vulgar espanta patos.

Quanto a isto, nada se poderá fazer.

                        Nenhuma seguradora cobre este tipo de 
                        inadequações.

                    A insalubridade mental é lixada. 






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NAÇÃO DANIFICADA

 


Cá na feira o carrossel  
atende qualquer míngua.

                        (Tipo ide foder outro). 

A cozinha tricotou um esmerado serviço de exéquias respeitando escrupulosamente a vontade do povo.

O polvo agradeceu.







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LÂMINA DE 7 MORTES

 


Brilha brilha estrela envergonhada.
Deita-te e aquece esta ausência 
escrita com letras de faca.
Sabes onde padece a dor 
e o tardio adormecer.
Brilha, brilha loucura abençoada.
Compõe no destino alquimias de sossego.
Fica comigo.
                        A noite especial aparecerá numa chuva 
corrupta disfarçada de ampolas emocionais.
Será razoável o segredo que vivemos?
Luas enlouquecidas 
abençoam o luar que nos aconchega.
É chegada a hora 
para que a escada do inferno 
finalmente repouse, num tempero 
manhosamente sofisticado.
Não importunar. 
Escreve-me a nuvem sentada neste desconforto. 






2025Jun01_aNTÓNIODEmiRANDA
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E NÃO PARAM DE ME FODER

 


Pátria minha gentil que 
pariste 
gente tão lerda que gosta de viver na merda

Povo que escolhes na lama
os pregos do teu caixão

Acreditas em quem te engana

Admiras quem te ofende

São eles que te fazem a cama

Os que roubam o teu pão sagrado

Nunca te cansas de ser enganado

Jamais terás a sua condição






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CONSTATAÇÃO AMBÍGUA

 



Ainda     Não     Sei

            Se         Irei

        Mas

            Se                 For

        

                    Estarei




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SOU EU NO SPA A MASSAJAR A RELIGIÃO

 


                    Olhando o comboio da teimosia, aceno ao adeus desenhado com lápis de ilusão.
                    Devagar, ordena a cansada fé. 
Nada será melhor do que o trago que te ofereço. 
                    Vida sem a tua importância, onde irá? 
Não pagaste o bilhete.
                    Milhões de lágrimas ardendo na ajuda que nunca chegará. 
O alento por vezes acontece.
                    Não abandones o deitar deste destino. 
Calma. 
                    Estou fora dessa fronteira!
Nada mais que um falsificado número tenho para o amor.
                    Sou como o dia seguinte: 
                    sem maneiras para acontecer.
Olá solidão minha estimada inimiga. 
                    Em ti aguardo o ruído do silêncio para planear novas cores. 
Mesmo que a esperança despida das mentiras acabe por celebrar o típico faz-de-conta para o amanhã nada lembrar.
                    Um desinspirado sinaleiro irá alterar a rota da solidão com que nascemos. 
Será eternamente triste a hora do estar que fizemos acontecer.


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AMOR (SE UM DIA PELO MENOS NÃO DESISTISSES) …

 


Noites deitadas no frio cetim

Palavras roubadas de um diário qualquer

Bêbadas promessas para o que nunca há-de acontecer

Luar trauteado num voo obsceno

Anjos da guarda desfilam no cortejo não identificado perante a admiração das flores do mal

Ninguém ainda ousou derreter as luzes da ribalta

Serve-se a náusea na passerelle da afronta


                            Ó amor!
                            (se um dia pelo menos não desistisses) …

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A COR DO SOM

 


            Recolhido na mortalha da vida escava nos sonhos fugidos a cor do som. 
Imagina-se cavaleiro do 7º céu enquanto sossega o suicídio injectando na sua morbidez a mais cruel sensibilidade.

            Uma pilha de imagens cola-se na alma como se fosse a seiva dos anos revoltados.

            Pintada pela cor do som a tela tenta fugir da parede dos distúrbios. 

            (Um raide de curiosos propositadamente certificados para o evento foi raptado por um comando fraternal desconhecendo-se até ao momento as implicações que esta acção terá no eventual desenvolvimento da sua ignorância).


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terça-feira, 10 de junho de 2025

REMETENTE NÃO ENCONTRADO

 


Amo-vos!


Mas por favor,


Não 


Abusem desta


Mentira.




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O TERÇO DAS PENITÊNCIAS

 


Sou aquilo que de mim nem sempre me apetece. Assim como uma salada de ossos momentaneamente desocupados. Perspicaz imolador de anúncios, repetidamente a amassar o descalabro para o arrecadar num cântaro de cinzas. E, numa piscadela furtiva, saúdo a velha pele, cúmplice de parábolas nem sempre bem-intencionadas. [Assinámos um pacto anti tirania]. Dizem que anda por aí a surfar numa padiola perante uma quadrilha de olhares invejosos. O terceiro segredo jaz num apocalipse intervencionado por lápis de cera. O tempo não o deixa mentir! Ameaça- o com uma enérgica tempestade de pó dos livros. A alameda da felicidade foi raptada, segundo o relatório das notícias da raiva. E no lugar onde o nada não termina, estende-se a toalha para o manhoso piquenique onde é proibido ler poesia. Não nasci para dormir com a tristeza nem uso no pescoço o terço das penitências. Sei que a traição do silêncio se esconde na varanda dos ocasos. Na esquina da impossível espera, tenho na mira o nojo delicadamente calibrado apesar da miopia entregue por anos maus conselheiros. Enviadas pelos mensageiros da sagrada esperança, memórias agradecidas desaguam no cais da minha gratidão. Então, ergo para o céu desgostos sem fim. Mãos sujas que nomes poderão chamar? Na certeza de todos os enganos, longos dias poderão tornar as horas mais desalentadas. Até porque na dor do desejo, a beleza será sempre uma actividade inflacionária.

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NÃO DIGAM A NINGUÉM ATÉ PORQUE NÃO É MENTIRA

 


            Ao rico nada lhe importa a inveja do 
pobre


            Aquilo que realmente o 
satisfaz 
é o ciúme de um outro opulento 







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LUXÚRIAS ANABOLIZANTES

 


Estás um velho gaiteiro diz 
a decrepita memória 

            São os olhos vomita, 
o humor apodrecido 

            Lábios corados de inveja 
aplaudem este clister

            Tens a tristeza no olhar,
            segreda a alma moribunda

Há muito que rasguei a caridade 
anunciada no autocarro da indústria 
da mentira 

Fico-me pelos olhares
que mesmo conhecendo certos 
defeitos não defraudam o meu 
suposto mau feitio

Que mais poderei oferecer 
            Se não aquele velho abraço 
            Da minha inseparável constelação 
            de nenúfares?





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LÁGRIMAS LAVRADAS COM SAUDADE

 


            Gosto do teu 
sabor 
            Onda 
suave de um mar 
acusado 
            De tanta 
ausência.

            Respeito o 
            chão 
            chorado 
            Nas 
            esperas 
            sem 
            Regresso 







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ESQUECIMENTO IMPERDOÁVEL

 


No sentido 
inverso 

Escreveu-me um 
verso 

Vesti o pijama ao 
nexo 

Deitei-me 
perplexo 

Num sonho 
ambidextro

Se a audácia não
 me abandonar

Fugirei do instante 

Sempre que o 
amanhã 

Nada de diferente 
anunciar.
 



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