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quinta-feira, 17 de outubro de 2019

BREVEMENTE, SENTADO NOS MEUS OSSOS

De nada me serviu o que pensei ser correcto. 
Não passo de um acidental leitor de epitáfios, a tentar riscar palavras que me magoam. O nada conseguido é a tristeza mais constante neste céu enlutado. Carrego a mais descalçada das almas, um formigueiro nos ombros, que só sabe apressar o relógio das horas verdadeiras, uma garrafa de whiskey com um rótulo comovente, um ardor que me leva para a despedida não obscena. Oculto a desilusão desta espera indecisa, vadia guardiã da ausência. Tudo me dói, neste patíbulo sem omissões. Continuo alojado no asilo das janelas sem liberdade. 
Estou cansado desta fidelidade a fingir, destes medos que já não me surpreendem. 
Abracei sem consideração, o destino traiçoeiro, a importância clandestina, e nada respeitei daquilo que pensavam que iria ser. É verdade que só imaginei as indecências menos maldosas, adormeci precocemente no meio de pernas de ébano, joguei todos os deuses na mesa da batota, e apertei definitivamente o nó da forca da autoridade. Se mais não pequei, assumo a minha não arrependida culpa. 
Estou acordado há demasiadas colheitas. O frio ainda espera o centeio, e anjos congelados, anseiam a osculação dominical com o iban devidamente identificado. Eu, sou só uma alma doce, nesta eucaristia coreografada por um curioso sem escrúpulos. Fecho os olhos, e ergo o choro para o lugar que me expulsou. 
Quem me indica o caminho? 
O bêbado da sacristia falida? 
O sinaleiro do partido mentiroso? 
A comissão sensacional das comichões? 
A procuradoria da ideia entupida? 
A meteorologia asmática? 
A simpática assistente operacional do centro nacional das estatísticas falidas? 
A bandeja da peidaria portuguesa? 
Quero adormecer com a desordem da minha cabeça. 
Só tenho aquilo que não vos interessa. 
Uma memória não distorcida, embrulhada nos estilhaços desta perda persistente. 
Só ouço os fantasmas desta tempestade que me entrega a loucura, como se o amanhã fosse uma possibilidade não aldrabada. 
Brevemente, sentado nos meus ossos, recuso a vergonha do tempo. 
Depois, 
nada prometo,mas 
talvez ainda seja capaz de fingir uma paixão violenta. 
Um dia, 
não são só horas! 
Mas, sobre isso, 
alguém poderá responder. 
Brevemente sentado nos meus ossos, escreverei em tons de fuligem, uma epístola, nunca em juízo perfeito, etiquetada. 

2019out_aNTÓNIODEmIRANDA

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