I
Cuida de mim disse o futuro enlutado no testamento – toma conta de todas as vírgulas – dos choros que escondeste – mesmo dos pecados a fingir – dos abraços falsamente coloridos – das opções hipoteticamente honestas – das orações fraudulentas que falharam o meu adormecer
Tem cuidado com a minha debilidade sentimental - com a inconstância da felicidade engolida em amargos travos de solidão
Cuida de mim - Estou confortavelmente só neste monte vestido de ruídos que acariciam a encruzilhada onde o diabo benzeu a cruz - Abandonei-me neste hangar de pássaros machucados - gritos sem som deitados no cobertor da minha angústia - Treme tudo nesta voz - gotas de frio nojento aconchegados na bandeja - A serena manhã espera por mim -
É tarde para adormecer -
Sempre! Sempre cedo para despertar -
Enrolo horas na espera dos dias fictícios -
A morte não acaba aqui
II
Talvez um dia seja feliz, disse a voz que arranhou a porta do céu.
A beleza zangou-se com a impaciência, e espalha um sentido vazio, diluído em lágrimas de chantilly certificado.
Cânticos de júbilo arredondam copas de árvores cansadas de tanta seca.
Aqui, no lugar de nenhures, caiam-se sorrisos plantados no musgo.
Vai longe o tempo que nunca nos encontrou, aqui, neste céu sem ninguém para saudar.
Leva-me contigo, pousa a velha e cansada voz nos meus cabelos.
Tanto que gostava de encaminhar o teu brilho, mas a luz que pintei fugiu da tela, e, sem me avisar, riscou do calendário o dia seguinte. Deixou uma estrela que devora paixões.
O que é feito de ti?
Diz a alma gentil que fingiste.
,2020Ago_aNTÓNIODEmIRANDA
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