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sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Convém não esquecer : BABI YAR (Yevgueni Yevtushenko)

 

Nenhum monumento supera o Babii Yar. 
A pedra sepulcral é uma pura lágrima. 
Eu estou com medo. 
Eu sou hoje tão remoto 
como todo o povo judeu. 
Agora vejo-me 
como um judeu. 
Aqui arrasto-me através do Egipto Antigo. 
Aqui eu morro, crucificado, na cruz, 
carregando as cicatrizes deixadas pelos pregos. 
Sinto-me como Dreyfus
O filisteu é simultaneamente o denunciante e o juiz. 
Sou prisioneiro. Estou cercado. 
Perseguido, cuspido e difamado. 
Grito, enquanto deliciosas senhoras decoradas 
com os seus laços de Bruxelas 
furam-me o rosto com os seus guarda-chuvas. 
Vejo-me então 
como uma criança novinha em Bialystok
O sangue escorre, derramado pelos soalhos. 
No salão do bar a multidão desperta 
para uma medida de vodka e cebola. 
Desamparado, levo com uma bota 
um pontapé no traseiro. 
Em vão suplico por piedade 
aos meus carniceiros. 
Enquanto isso troçam e disparam, 
"Derrotem os judeus. Salvem a Rússia!" 
e um caceteiro bate na minha mãe. 
Ó meus povos russos! 
Eu sei, vocês são internacionalistas. 
Mas aqueles que têm as mãos sujas 
em vão vos retiraram a pureza do vosso nome. 
Eu conheço a bondade da minha terra. 
Mas os anti-semitas são vis 
e não caem em deliquo. 
Intitulam-se orgulhosamente 
de "A União dos Povos Russos!" 
Eu vi, como Anne Frank, 
os límpidos ramos da Primavera. 
E eu amo. 
Não preciso de frases vazias. 
Necessito apenas do que descobrimos dentro de nós. 
O que mal se pode ver ou cheirar! 
Não nos deixam partir 
e é-nos negado o céu! 
Contudo podemos abraçar-nos ternamente 
na escuridão de um quarto. 
Eles estão chegando? 
Não tenham medo. 
É o retinir suave da própria Primavera - 
a Primavera já vem a caminho. 
Chegando até mim. 
Despeçam-se depressa. 
Estão quebrando algo debaixo da porta? 
Não, é o gelo que se parte... 
A erva selvagem murmura sobre Babii Yar
As árvores olham agourentas 
como os verdugos. 
Aqui todas as coisas gritam em silêncio, 
e, dentro da minha cabeça, lentamente, 
sinto-me transformado em cinza. 
E sou eu mesmo 
a soltar um berro tonitruante 
pelos muitos milhares aqui enterrados. 
Eu sou 
cada velhinho aqui abatido a tiro. 
Eu sou cada criança aqui abatida a tiro. 
Nada será esquecido dentro de mim. 
Deixem a "Internacional" trovejar 
quando o último anti-semita na terra 
for enterrado para sempre. 
Não tenho um pingo de sangue judeu. 
Mas, na sua raiva insensível 
todos os anti-semitas 
devem odiar-me agora 
como se eu fosse um judeu. 
Mas até por essa razão 
Eu sou um verdadeiro russo!




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