Pesquisar neste blogue

sexta-feira, 30 de junho de 2023

O QUE VAI SER DE MIM, AMANHÃ?

 

( De uma reportagem na televisão sobre a situação de homens com mais de 50 anos, vivendo nas ruínas de um condomínio de luxo, cuja construção não foi concluída )



O QUE VAI SER DE MIM, AMANHÃ ?
FUI MÃO DE OBRA
DESCARADAMENTE ABUSADA
NÃO TENHO NÚMERO
NÃO PUDE PREENCHER O IMPRESSO DO DESEMPREGO
SOU ILEGAL NA VIDA E  NA ESPERANÇA
NÃO CONSTANTE NA SEGURANÇA SOCIAL
NEM O RESTO JÁ SOU
INCÓGNITO NA MINHA RUÍNA ESCORREGO
PERFIL AUSENTE SEM POTENCIAL
QUALQUER MELIANTE FARSANTE
REUNE PERSPECTIVAS INFINITAMENTE DIFERENTES E MELHORES DO QUE AS MINHAS.
EU SINTO NA PELE QUE ME FOGE
QUE A SOLIDARIEDADE SÓ FUNCIONA EM CATÁLOGOS COM EDIÇÃO LIMITADA !
EU SEI QUE A MINHA ANGÚSTIA DE NADA SERVE !
EU SEI QUE O MEU NOJO NADA INCOMODA !
MAS TAMBÉM SEI QUE NUNCA SERÁ PACÍFICA 
A MANEIRA DE ACABAR COM ISTO !
NADA TENHO ! NADA É MEU !
A VIDA É SEMPRE A PERDER.
VOU TENTAR...
MAS,
O QUE VAI SER DE MIM, AMANHÃ ?
È ASSIM QUE GASTO O SONO.
NINGUÉM MERECE VIVER ISTO.
MAS, COMO ESCREVEU O POETA :

ESTÁ TUDO BEM, MÃE. 
NÃO SE PREOCUPE:
ELES SÓ ESTÃO A CHUPAR O MEU SANGUE,
EMBORA HÁ MUITO EU ESTEJA MORTO
”.

2014.aNTÓNIODEmIRANDA

WHO´S GONNA TELL YOU BABY

Who´s gonna tell you baby
As horas convenientes para amar
Quando poderei assassinar o teu vestido
E tu já sabes que o meu corpo
É um monstro insanamente conduzido
A dor não existe
O paraíso como sempre está ocupado
Vou beijar as gotas do teu véu.

Who´s gonna tell you baby
Who´s gonna tell you now

O sol voltou a brilhar ...


ANTÓNIODEmIRANDA

SE TE CHAMAM VAIDOSO

 


quinta-feira, 29 de junho de 2023

E ADORMECIA …

Limpava alguns momentos à procura  de boas notícias na página da necrologia do jornal pousado na mesa do café e invariavelmente discutia a desilusão com o barbeiro.
Depois seguia até à paragem da camioneta que religiosamente tinha partido às sete da manhã. 
E esperava pelo carro do peixeiro, sempre com a esperança de um atraso que era raro acontecer.
Dava um pulo à horta para regar os tomates, e encostado ao muro habitual, contava vagarosamente as badaladas do sino da igreja, não que tivesse interesse, mas podia ser que desta vez elas não sincronizassem com o relógio que tinha comprado na loja do chinês.
Tinha saudades da cavaqueira da feira, mas agora está tudo tão fraco e longe, mais longe, do que o tempo que tem para gastar. 
Chegava a casa e ligava a televisão e telefonava para o número mágico que lhe prometia um prémio de não deitar fora. 
Quando fosse á cidade, haveria de comprar um telemóvel novo. 
O seu só funcionava para chamadas sem ofertas. 
Além disso queria fazer boa figura quando fosse à festa da aldeia. 
E continuava a cismar com a mania de pôr a mota em cima da mesa do snooker. 
Claro que gostava muito dela e aos poucos foi perdendo a saudade do ribombar das bolas. 
E o canito já estava velho para as apanhar.
Não ia para a cama sem visitar a adega, agora que não podia beber nem vinho nem aguardente que teimava em fazer. Talvez alguém apareça hoje e lhe dê dois dedos de conversa. 
Não será pedir muito. 
E adormecia ...

,2016_,aNTÓNIODEmIRANDA

 

quarta-feira, 28 de junho de 2023

Edições 50kg: ...

Edições 50kg: ...:  

SIMPLESMENTE...


 

SIMPLICIDADE

Nada tenho a ver com isto!
Quando ouço poesia
liofilizada,
dicção amestrada,
aplausos higiénicos
e uma tentativa frustrada
de roubar as palavras
do poema.

Confesso que me dá pena!

Começo sempre por escrever só para mim.
Embora eu próprio nem isso mereça.
Eu só queria ser capaz de pintar ideias, 
e nos intervalos que me compreendem, 
dirigir o desejo para o vermelho que beijo, 
quando fecho os olhos que abrem a janela especial.
Só isto!
Nada de riscos que me embaciam os olhos, 
nada mais complicado, 
do que a simplicidade que pretendo abraçar.


2018Mar_aNTÓNIODEmIRANDA

domingo, 25 de junho de 2023

Skip James - Hard Time Killin' Floor Blues (Live '67) HQ * HARD KILLING FLOOR (para Skip James)



HARD KILLING FLOOR 
(para Skip James)


Foi este o chão que nos matou
onde a fome nunca passou ao lado
enquanto brincavam com a justiça 
sempre feita às suas medidas.
Lambíamos as feridas do chicote 
com o trago da ausência do pão 
e roíamos nessas noites sem fim 
lágrimas que só queimavam a pele.
Chão de tristeza sem cura 
banhado num dorido latido de cão
entoado numa canção sem esperança
chorada na mania absurda de cantar 
a manhã de todos os sonhos.
O algodão que enchia o nosso desespero 
era o mais pesado de todos os castigos.
“Hard killing floor”.
Chão ferido, 
regado com todos os suores 
tingidos de sangue.




,2017out_aNTÓNIODEmIRANDA


ISSO ACONTECE SEMPRE AOS PIORES

 



Quando não se consegue explicar 
aquilo que julgámos ter entendido,
não há motivo para preocupação.


Isso acontece sempre aos piores.



,2017out_aNTÓNIODEmIRANDA


sábado, 24 de junho de 2023

POTE DE CINZAS

Alguns dos amores que me incendiaram

esconderam-se

num

pote
de
cinzas



2019jun_aNTÓNIODEmIRANDA

UMA VELHA HISTÓRIA...

Maria má.

Não olhes para mim, assim.

Não me apetece voltar a brincar...

Foi só um baile de máscaras.

A mim,
calhou-me o disfarce do espírito santo.






,2015aNTÓNIOdemIRANDA

sexta-feira, 23 de junho de 2023

EU UM DIA

 



Não sou fronteira de nada

De qualquer maneira
não é o meu ser

Fogueira apagada
não sei que fogo
me deixou de arder

Apenas sou eu
de mim próprio
sem sim

Eu
viagem ainda não começada
com bilhete de ida
sem volta anunciada
Eu não melhor que nada 

Eu um dia
para acontecer

_2014_aNTÓNIODEmIRANDA

EXORCISMO


Que poemas poderão agora ser escritos?
Não sei. Tu é que és o mestre!
Não chamemos estranhos para este serviço,
cuspiu o aparo da minha caneta.
Chegámos à ponte e nem sequer tomámos nota
Dos nomes dos barcos.
E pintámos as manhãs com círculos dourados
Que o sol nos ia entregando.
Poetas como devem ser,
disfarçados de saltimbancos,
acenavam alegremente,
exibindo palavras sem dicionário.
Era tão perto aquela ponte onde nunca estivemos.
O lugar onde ninguém se procura.
Onde querubins com asas tatuadas,
bailavam com bíblias na mão,
e um esquilo fingindo ler o Diário Popular,
mostrava-se atento à nossa inquietação.
Era tarde,
talvez com um cedo demasiado precoce,
para a entrega do último relatório,
onde a primeira página é sempre a mais mentirosa das notícias.
E no relvado daquele parque, cresciam plantas sabiamente regadas por quem só sabia cuidar das rosas.
Havia discursos para todos os gostos, profecias anunciando o fim da eternidade e freiras pornográficas a ler sinas à la carte. E patinadoras com corpos de cisnes infelizes, ofereciam tampaxes mentolados a reformados apressados na espera da chegada da morte. Dos ramos das árvores, pendiam poemas com lamentos desbotados por tanta injúria.
Na hora do almoço, o funcionário da repartição comia o milho dos pombos, e disfarçadamente metia no bolso folhas de alface, como se fossem notas de cinco euros. 
Acabava o trabalho com o miserável hálito a alho, e regressava a uma casa que nunca iria acabar de pagar. 
No caminho, mantinha o cuidado habitual de não pisar a merda, que o vizinho do lado tinha  deitado pela janela.
Acendia as pipocas, ligava a pizza, cumprimentava o hambúrguer e imaginava ligar os 170 canais da televisão que há muito  tinha saído da sala.
A mulher  fugiu com o melhor amigo, mas o pastor confortou-o dizendo que ela tinha escolhido o caminho do diabo.
Mandou-o em paz e recomendou as orações do costume,
Ela de joelhos no confessionário,
fez-lhe um exorcismo demorado…

,2016,06aNTÓNIODEmIRANDA

CASACO ENCASPADO


Desculpem a interrupção: 
A estupidez segue dentro de momentos.
Combata as rugas na boutique do tempo,
onde se vendem relógios mentirosos.
Cocktail generoso.
Croquetes deliciosos.
Na academia das águas livres de tudo aquilo que nos possa fazer bem.
Assim, não vais longe, 
dizem os imbecis que têm na distância 
a única certeza adquirida.
Tenho percorrido muitos dos caminhos 
que me proponho, 
pisado pedras, cantado algumas solidões,
saboreado todas as indecisões.
Mas no meu filme sou sempre o actor principal.
A liberdade não é um acessório.
Saída de emergência.
Informações úteis sobre a validação
da sua não identidade.
Gerir contrato
Não fumadores de quê?
Cuidados intensivos.
Cadilhos paliativos.
Memórias cremadas.
Corpos cromados
Código pessoal.
Gerente de conta.
Caixa geral de consensos.
O rendimento voltou.
Gestor da vontade.
Encruzilhada semaforizada.
Trabalho ocasional.
Acção temporariamente só.
Arrendamento
Parqueamento
O presente perfeito
Oferta demolidora
Quanto tempo falta?
Mude de perspectiva.
Congresso nacional dos mamadores.
Convenção anû(s)al dos enganadores.
Curva perigosa.
Rua sem saída.
Trânsito condicionado.
Casaco encaspado.
Contracção.
Comichão.
Infecção.
Comissão.
Dilatação. 
Degustação de pecados no céu.
O convite está feito!
Apareçam sem eu dar por ela.


.2014aNTÓNIODEmIRANDA

ATENSSSSSÃO!

 


NO DOCE BARAÇO DA SORTE

 




CAMINHO BORDADO

 


Estavas magnífica ontem no Verão 
que cobria o chão da velha praça
onde nem um olhar trocamos

Sorrias abrindo as pregas do vestido 
e a música parava só para te ver

Embalado na leveza do teu andar
imaginava a melhor maneira para te despir

Era somente uma boa intenção 
aquilo que de mim ensaiava

Fiquei só 
como sempre neste caminho 
bordado  pela tua luz.



2017,jun_aNTÓNIODEmIRANDA

SATÉLITE APAGADO

Não me sinto bem
e tu não me podes ajudar.
Deitada nesse sofá com o mapa do mundo
fora do teu olhar
vejo o filme que nada quer saber de ti.
E,
tu que conhecias de cor os intervalos do nosso amor,
és um satélite apagado
rogando-me um perdão não aceitável.
Só posso cantar-te nesta tela triste
que o céu que pintámos não aceita.
O que farei com o teu último sorriso?
Eu,
que tanto me queimo nos caminhos do teu fogo!
Mas, está tudo bem, minha querida.
Não fiques ofendida!
Isto poderá ser unicamente uma dança de rock`n`roll.



,2017nov_aNTÓNIODEmIRANDA

HORÓSCOPO

Nada me satisfaz neste rosário de lesmas 
agarrado às minhas voltas. 
Não consigo achar o sentido da beleza, 
perco-me em divagações malparidas, 
escondo-me nos fumos dos cigarros, 
neste encontro sem chegada. 
Jogo às mentiras, 
detesto a paciência e a sua inútil calma, 
atiro sorrisos enganados para a parede. 
Tenho na garganta 4 tiros amestrados, 
uma fogueira de hipóteses queimadas, 
um manual de soluções fora de prazo.
Agradeço ao tempo 
a conta desigual com que nos aturamos. 
Neste lapso do amigável engano, 
risco do horóscopo as possibilidades fictícias.

,2020mai_aNTÓNIODEmIRANDA

quarta-feira, 21 de junho de 2023

DESENHO

 


Desenho

O desejo

em forma do beijo
cobrindo o teu corpo
percorrido
pela minha língua subtil
Convite delinquente
Sexo húmido e quente
a desejar que nele eu entre
entre palavras e gemidos

Volúpia dita aos ouvidos


.

Junho24.2010_aNTÓNIODEmIRANDA

AS NOITES DO ÚLTIMO DIA

 

Dói-me a alma, geme-me o peito.
Não ando nada satisfeito
com as noites do último dia.
Gostaria que a última, 
fosse somente a véspera dessa mesma coisa.
Cansado do teu fantasma,
não quero mais esta faca espetada nas minhas costas.
Só pretendo tomar conta do meu tempo
sem deixar que o meu sangue
sirva de exemplo para alguém.
Não necessito de sorrisos emoldurados
nem de ingenuidades abusivamente oferecidas.
Não pretendo salvar nada!
É uma hipótese que nunca me apetece.

Sou agora,
uma sombra distraída
& mantenho todo o cuidado para a não pisar.

.2015aNTÓNIOdemIRANDA

EXPLICAÇÃO



Nem 
Sempre
Aquilo
Que
Quero
Sonhar

Me

Apetece



,2020mai_aNTÓNIODEmIRANDA

terça-feira, 20 de junho de 2023

AI DE TI

 


Ai de ti que nem do teu inútil eu
consegues fugir

Velha carne
pele enrugada
sórdida estima
verruga negra
massajando uma sarna vulgar

Degeneração amanhada
num abrolhamento prévio

Visão ferruginosa.
que pena esta  vida
que tanto te castiga.


2017set_aNTÓNIODEmIRANDA
Vila Chã

segunda-feira, 19 de junho de 2023

QUANDO A BELEZA BATE

 
Quando a beleza bate, é justo falar de pétalas doridas, dos despojos da falência total, de todos os desvios sangrentos e da denúncia amarrotada com efeitos aplicados.
Quando a beleza bate, o nosso fabrico próprio não gera uma só qualidade e tem o gosto da eficácia dos incapazes.
Nuances  recheadas de presunções imbatíveis enquanto cada minuto fere mais que o anterior.
Quando a beleza bate, leva-nos à próxima paragem onde apanhamos a ternura desnudada para as horas arrendadas que sofremos na escola preparatória dos desejos.
Quando a beleza bate, faz de nós gente sem pés na alma e oferece-nos a vitrificação das lágrimas que agora se refugiam  
na avenida da gentileza absurda.




2016,11aNTÓNIODEmIRANDA

PROMESSA ANÓNIMA

 


LEVA-ME PARA CASA!



Em cima de ti


                Me cansarei



2016,02_aNTÓNIODEmIRANDA


QUEM NÃO SABE

 


Quem 

não sabe 

dizer 

até 

Logo

Nunca espera o 

Amanhã



,2016_aNTÓNIODEmIRANDA


PSICANÁLISE

 


Tenho um tédio tão 

Preguiçoso

que nem se levanta

para se 

Deitar no sofá



,2016aNTÓNIODEmIRANDA


CHICO BUARQUE DA HOLANDA * PARABÉNS *Geni E O Zepelim

O QUE QUERO SEI DE COR E SALTEADO


Muitas vezes embebedo-me com 
silêncios

Não oferecem a ressaca da traição

Odeio indignações 
temporárias

Rejeito celebrações 
oportunistas

Não me convidem para gostar

O que quero
sei de cor e salteado



,2020Jun_aNTÓNIODEmIRANDA

NOITE UNIPESSOAL

 


Pus a memória num aquário 
mas sinto que ela não gosta 
das migalhas que lhe ofereço.
Espera-me um duelo onde 
toda a minha batota será derrotada.
Vou mimando 
o engano do mundo
fingindo sempre
que o consigo vencer.
Guardo na cabeça este vício
Como se fosse uma maldosa transfusão
que percorre as minhas veias.
E engulo pastilhas para a depressão arterial.
E estou preocupado!
Deveras preocupado,
porque já não consigo
o desespero de alguma lágrima bondosa.
Agora é esperar
que a noite unipessoal
se embrulhe nos lençóis.




2016,11aNTÓNIODEmIRANDA

NUNCA SORRIO PARA MIM DESCONFIADO

 

De onde saio?
Do tempo infame ou terei de continuar no corredor das fintas curtas e golpes de rins vendidos em qualquer talho? Mastigo sem gosto a sopa de letras que não sei ler e nos passos em cima da linha, 
alinho contradições que só a mim dizem respeito.
Longe, naquele lugar que às vezes encontro e que de tanto o achar, o desencontro, procuro uma lucidez que não me dê muito trabalho. 
Sento-me na paragem da espera do tempo, agarro o fôlego e envio para o céu códigos escritos com a nuvem dos cigarros que fumo. 
É sempre necessário admitir que nem tudo o que me seduz é ouro. Já tenho a pele com a certeza do couro e demasiadas pulseiras antagónicas para soletrar penas nunca cumpridas.
O bom filho a casa rouba e a mais não é obrigado. 
Sou um desalinhado com algum jeito para centrar exacto o esférico em direcção à cobiça adversária.
 Os estúpidos  não compreendem 
os meus contrários, e assumo quando me apetece,
que a minha aspiração na vida nunca foi corriqueira. 
Gosto do que sou 
amo o que gosto mas isso é tão banal que nem importância lhe dou.
Finjo que não ouço mas nunca me esqueço.
Aqueço o espelho para que o vapor 
não mude a risca do meu penteado.
Nunca sorrio para mim desconfiado 
e não confio absolutamente nada 
num relógio que admita enfeitar o meu pulso.


,2017,abr_.aNTÓNIODEmIRANDA

O CÉU NÃO É LUGAR QUE ME ESPERE

 

O céu não é lugar que me espere.
30 cêntimos na algibeira 
uma harmónica enferrujada
guitarra velha companheira
de uma alma envergonhada
& Blues que choram comigo.
Estou no caminho da tristeza
com curvas sexy 
e doces olhos cor de fel
escorrendo numa escala atrevida
o olhar que de mim se vai despedindo.
Noites enroladas em bancos de jardim
um saco pesado com nomes
um quadro escrito que pensava 
que tinha o tempo na mão
e memórias alisadas com folhas 
de lixa de água. 
Eram os meses com manhãs obrigatórias 
em que encharcava a barba mal parida 
com ternuras de Old Spice.
Risca ao lado para disfarçar o enfado 
gravata com nó elástico
e um caminhar absolutamente absurdo 
para encher de frustrações 
o depósito diário de 7,35h.
O céu não é lugar que me espere.
Repito nestes velhos acordes
um voo para nenhures
até que não sobre um osso desta tristeza.

2017,ago_aNTÓNIODEmIRANDA




sexta-feira, 16 de junho de 2023

A NAVALHA

 


A beleza passava sempre ao lado. 
No bornal da fome, 
ilustrado com fotos da terra dos sonhos caídos, 
vadiava a angústia de todas as horas. 
Martelava a saudade no banco da estação de Santa Apolónia, e escondia o regresso no miolo da broa, 
tão dura como a sua solidão. 
Sabia de cor todos os horários, 
que um bilhete, 
certa vez sonhado no único sono bonito, 
lhe prometera.
Na camarata, lia às escondidas, 
postais tristes que nunca teve coragem 
de meter no marco do correio.
A manhã seguinte, 
era o único castigo que o mantinha por cá. 
E a navalha, 
a sua fiel companheira, 
só se deitava após o seu adormecer.
Na enxerga, nunca houve lugar para sonhar.





2018Set_aNTÓNIODEmIRANDA

quinta-feira, 15 de junho de 2023

MEMORANDUM DESQUALIFICADO

-1
Tenho muitos prazeres na vida. Espero assim que não me peça juros pelas contas que tenho pago. A minha cabeça não pára de me abanar as ideias, e perversa como ela é, ignora a maleabilidade do meu esqueleto. No sentido inverso da palavra, aperto numa mola os papéis dos recados escritos com letras esquecidas. Não desenhei as gargalhadas que ouço de um recém-nascido já com cabelos no peito. É preciso paciência, diz-me a envergonhada decência, com a minha falta de pudor para apodrecer coisas menores. Preciso de um atestado, emocionado e mesmo não assinado, que ilustre a perspectiva da minha indulgência. Algumas ondas, se o estio for talentoso, flores sujas, se o inverno for amargoso e um q.b. de azia para queimarem a pedra fria. 
Saúdo-vos com todo o incenso que rega os sonhos vazios.
Tudo o que ficar será sempre a nossa poeira.
-2
Preciso de uma alcofa para congelar os poemas que não consigo escrever. De um estetoscópio digno e constipado, para de vez em quando lavrar as músicas da minha cabeça. De uma palavra amiga mas não conselheira para picar o gelo dos meus silêncios. Não é muito, diz-me o pai natal mascarado de boneco bolorento. Preciso sobretudo, da equação certa para consertar o meu tempo.
-3
Estou algemado com eloquências aparelhadas num contraplacado neurótico, cortado à medida da minha insolvência. Má sorte ter escolhido esta lâmina onde escorrem gritos que me entontecem. Entreguem-me outro sangue, sem plasma sintético, sem dor insonorizada, mas com penas voadoras cozinhadas na beleza de um sentido atrevido.
-4
Preciso de uma atitude profiláctica, de uma vontade automática, de uma drenagem linfática para a minha coragem de continuar a ser.
-0
Lucidez guerreira que navega numa enseada exaltada para amainar poemas com o passo certeiro fé depravada nesta escudada loucura de ousar um memorandum desqualificado.


2016,11aNTÓNIODEmIRANDA

O RESTO



 Gosto das ondas

Que prometem caminhos

O resto

                            Fica à beira-mar...



,2015aNTÓNIODEmIRANDA

MAR VADIO

Que fiz de errado?
Só pretendi um tímido abraço
entregue por um fantasma simpático
escondido  nas cortinas
do teu sorriso
Mau juízo eu tenho
do amor que por ti padeço
Vou contigo na volta do nunca
Por ti espero
mas em ti não me aconteço
Má sorte na estrela que não aparece
Os sonhos
partem na espuma do meu futuro desconfiado
Nada faz sentido na demora que te odeia
Há um barco de lágrimas doridas
em busca do naufrágio sem lamentações
O que farei contigo
mar vadio?
Como entregar
a sombra que ainda me resta?





,2020Mar_aNTÓNIODEmIRANDA


VISTO ONTEM. Poema para WILL SAMPSON O ÍNDIO-CHEFE BROMDEN #VOANDO SOBRE UM NINHO DE CUCOS#

 

Olhos rasos contemplam a magnitude.
Ovos com óculos na testa
Agradecem estrelando salmos de gratidão
Com gemas de incenso.
Lá fora
No lugar que não existe
E no tempo combinado
Um canto gregoriano
Com o hábito da semente proibida
Mostra notícias
Das horas não acontecidas.
Meticulosamente arrumam-se gavetas
Antes que o pó as revolte.
Sei quase tudo
Do meu nada imenso.
E isso só me serve
Para saudar
Delícias turcas
Que sem o meu sentido
Voam sobre um ninho de cucos.



,2016,05.aNTÓNIODEmIRANDA




RECOGNIÇÃO

 

Errar -  melhor
Pecar -  venialmente
Falhar – como -  deve - ser
Manchar -  pulmões -  de -  néon
Não -  há -  pressa -  para -  o -  silêncio
quando -  este -  dorme -  no -  rodapé -  da -  virtude
Escorregar -  na -  casca -  da -  vergonha
Cair -  no -  sentido -  errado
como -  se -  fosse -  a -  última vez.
Colorir – os -  ponteiros -  do -  relógio
Dar – corda – ao -  pulso
Agitar – o - impulso
Esperar -  a -  crítica -  especializada 
Emerdar – o – conceito
do- que - tem – de – ser – perfeito
Desconfiar – da – gratidão – fingida
Amar – sem – parar
e – inundar – as – veias – de – cansaço
Não – evitar – o – abraço
Desapertar – o – laço
Enfeitar – a – poesia – com – prazer – peculiar
Tingir – o – mundo – moribundo
Uivar – o – lamento – envelhecido
Beber – a – catatonia
como – sumo - genital
Olhar -  o -  pássaro -  na -  palma – da -  mão
&

Envelhecer - dignamente



,2016,06aNTÓNIODEmIRANDA


O FEITIÇO DA LUA

 (

Tapa-me

O

Remorso

Senão

Morro

De

Frio

)


,2022Mai_aNTÓNIODEmIRANDA


DIÁRIO DE UM CAMAFEU

 

Nada significo
Continuo a nada ser 
Aquilo que pensam que sou 
É apenas uma conta errada

Anos a fio mergulhado num desatino 
demasiado tempo naufragado nas marés feias 
que dos conselhos soldados nos ouvidos 
nem um sobrou para enfeitar 
a árvore dos amigos infalíveis

Errei o tiro
A mira torcida confirmou a angústia das equações batoteiras
escondidas no sopé da boa vontade

Um anjo mascarado abraçou o meu embaraço

Adoro molestar ideias pretensiosas
sentar-me nas longas conversas das teorias não absolutas espalhar resíduos recicláveis do tempo que me acompanha

Na noite dos silêncios obscuros 
Deixei de sonhar por ti 
Pátria que me entregavas
Despedidas sem fim

A felicidade nunca deixou de ser 
uma soma drasticamente difícil



,2022Mai_aNTÓNIODEmIRANDA


VENTOS DESLEAIS ASSASSINARAM O CAMINHO

 


Disseram que já não existe a casa onde nasci.

Não fiquei admirado.

Há muito que sinto esse vazio.

Deixei de roubar tempo ao momento
e nem consigo trocar o pó da memória

Esta cidade e eu 
velhos desconhecidos
calcamos as coordenadas que nos conduzem 
a lado nenhum

Mesmo assim
regresso sempre que posso
às pedras daquela rua
agarrado à fotografia
rasgada pela ausência daqueles 
que com tantos sorrisos me beijaram

Ventos desleais 
assassinaram o caminho


,2022Mar_aNTÓNIODEmIRANDA

PODE

 


Pode o destino não ter caminho
Pode o rio não beijar o mar
Pode a vida estar ao contrário
Pode o grito ser solitário
Pode o tempo correr devagar
Pode o sonho ser esquecido
Pode o fruto não ser proibido
Pode o leito não ser de morte
Pode-se nascer no lado errado da sorte
Pode a navalha não ter fio
Pode o humor ser adiado
Pode o rico ser desconfiado
Pode o pobre ser certificado
Pode o poema não ser lido
Pode o voo ser cancelado
Pode o sol mentir á lua
Pode a rainha andar nua
Pode o ministro ser sinistro

PODE A VIDA SER UM ESTRANHO LUGAR PARA SE MORRER


mai2013_16_aNTÓNIODEmIRANDA

RELÓGIOS ATRAPALHADOS

 


Cansei de não ser ninguém

De pensar que a lembrança nunca morreria
mas o corpo moído de recordar 
os dias que têm o tempo mais curto
entregava horas perfumadas 
com venenos ávidos de saborearem a desilusão

É triste este relicário obsceno 
onde guardo cumplicidades sedutoras

Relógios atrapalhados, 
reclamam nos meus braços
um porvir não traiçoeiro 

Se calhar haverá um sentido nesta fuga
que não se farta de perseguir 
a saudade que não me abandona 

Sou eu, sem mundo para caminhar 
acariciando memórias tão inúteis 
como a lisonja que me oferecem

A esperança foi para longe
resta-me contar lágrimas 

Cai a noite

Os últimos passos não chegam à estação

O presente foge demasiado apressado 
numa doida correria 
como se eu dele quisesse furtar os sorrisos 
que até então me entregavam paraísos
adormecidos em camas de lençóis esperançados 
em todas as possibilidades 
das manhãs prometedoras


,2022Abr_aNTÓNIODEmIRANDA

AO DOMINGO NO CORETO

 

(já não falamos sobre isso)

Juntamo-nos ao domingo no coreto 

dos auspícios malandros, 

E, 

Assim, 

Ainda conseguimos trocar mentiras



,2022Mai_aNTÓNIODEmIRANDA

EM PICADILLY CIRCUS, PODIA TER SIDO ASSIM

 

Agora lê poesia no pátio das mortes
onde grandes pássaros
acendem cachimbos com misturas curiosas.

E goteja palavras
só entendidas por poetas descalços.

Escorrem ácidos
de taças lacrimosas
que tornam brandos todos os queixumes.

E os poetas felizes,
andam ao colo dos anjos
abraçando assim a humanidade possível.

Poderia ter acontecido em Picadilly Circus.


,2016,07aNTÓNIODEmIRANDA


DESALENTO

 

Fogem

dias

na

minha

esperança



,2022Abr_aNTÓNIODEmIRANDA

DERIVA

 Se o teu céu 

não tem a cor do meu estar

na languidez  que respiras 

prometo não deixar qualquer vestígio 

senão estas horas esquartejadas

no beco dos desperdícios


,2022Mai_aNTÓNIODEmIRANDA





quarta-feira, 14 de junho de 2023

TULLAMORE DEW (solução não aquosa)

 


Já não me interesso por muitas coisas. 
Arrumar livros, é uma sedutora tarefa. 
Mas, não passa de um desejo breve, 
que se cola na vontade cansada. 
Lembro-me do que quero, 
mas, não me apetece escrever sobre isso. 
Dispo-me enquanto imagino 
que o caminho mais hábil para a cama, 
será a dificuldade em encontrar um qualquer sossego.
Alivio esta dúvida, 
numa solução não aquosa de 
“Tullamore Dew”.

É bom, 
e vende-se sem receita médica. 



2019mai_aNTÓNIODEmIRANDA









ODECEIXE_1974: AQUELE AGOSTO !

 


CONCLUSÃO ÓBVIA

 

A sardinha estava boa!

… Mas nós, 

continuamos irresistíveis!

(Dizia o pepino, ladeado por 2 tomates).


,2015_aNTÓNIODEmIRANDA

ENTRE A AUSÊNCIA E A PRESENÇA O PASSADO É-ME FIEL

O importante é não nos comprometermos com as pessoas, não que temamos as consequências, mas porque não aceitamos e rejeitamos a realidade em que vivem. A futilidade do seu quotidiano é a sua mais notória falta de imaginação. Pensar, é aquilo que elas não conseguem, mesmo quando não têm nada para fazer.
Se eu tivesse um Ferrari fazia amor com ele...
. Se eu fosse pato gostava de ser gato. Se eu fosse francês não falaria emigrante. Se eu fosse esperma escolheria o teu corpo para navegar. Quem pôs a bomba? Senti a sua explosão no meu corpo & logo pensei que tivessem inventado o amor. Acredito no amor, não como palavra, não como acto, mas como desejo.
É preciso estarmos atentos vigilantes não só a nós mesmos mas também aos nossos instintos naturais. Somos sensíveis, mudamos frequentemente, e quando isso acontece, nada se altera. Hoje pode dizer-se que naquele verão estavas magnífica e eu posso também afirmar, embora não publicamente, que às vezes precisava de ti imaginando-te drogada & quando tu aparecias, o que nunca aconteceu, eu olhava-te e convidava-te para me cortares as unhas dos pés. Lembro-me perfeitamente do sorriso que tinhas quando me olhaste com o dedo que não tinha unha entre as mãos: mas eu sabia, sim eu sabia que isso mais dia menos dia iria acontecer. E eu toquei-te e tu disseste não e eu beijei-te e tu disseste não e eu desejei-te e tu disseste não. Visivelmente cansados pela nossa primeira experiência permanecemos pedrados de mãos dadas na cama, cuspindo para o tecto tentando acertar numa casca de ovo horrivelmente pintada. Aproveitei para pôr no gira-charros Woodie Guthrie & tu gostaste! Ouvindo Sonny Terry e Brownnie McGhee e perguntaste o que era um blue. E eu disse-te ao ouvido : sabes pá, quando um gajo está na merda com a sua girl friend, pega na guitarra e acontece o blue :
“Eu nasci na auto-estrada 64 e a primeira refeição que tive foi uma boleia. Cresci, embora não muito, no meio de negros de caracóis dourados. Engolindo o fumo dos seus cigarros, eu ouvia-os longo longo tempo cantando : oh deus ! oh deus ! porque é que isto acontece ? Porquê trabalho eu tanto para o outro ter Mercedes Benz ?”
Comecei a trabalhar, não muito frequentemente, gastando todo o dinheiro em livrarias, até ficar com calos nas mãos de tanto pegar nos livros que muitas vezes não tinha hipótese de comprar. Era sempre um desejo adiado. Passei dias no café Pigalle observando os craques do bilhar e os curiosos das slot machines. Aprendi a conhecer pelo cheiro das beatas que fumava a marca de alguns charutos e tinha como passatempo preferido, mudar as etiquetas das garrafas de vinho nos supermercados, tornando assim viável a compra com o preço adequado ás minhas reais possibilidades. E pensei em mudar. Disse á minha namorada : estou cansado de andar por aí, quero fixar-me, tenho de casar.
Mas devemos de estar atentos, não mudamos quando queremos, mas porque quase sempre somos obrigados a fazê-lo. Não somos tão sensíveis como imaginamos e tão sólidos como de tal temos a certeza.

Entre a ausência e a presença o passado é-me fiel.
… Embora se saiba que a fidelidade, também é uma companhia de seguros…


.76*2014.antóniodemiranda

A LUA NÃO CABE EM TODO O MUNDO



Quando os meus dedos saem da tua pele,
e os meus olhos diluídos
na procura do pecado que me ofereces,
escondem as noites sem ti,
embalo a canção triste,
num desabafo que sempre me trai.
Finjo na tua boca
o abraço perdido.
A lua não cabe em todo o mundo.


,2017out_aNTÓNIODEmIRANDA

José Agustín Goytisolo (1931-2017) PALABRAS PARA JULIA

Tú no puedes volver atrás
porque la vida ya te empuja
como un aullido interminable.

Hija mía es mejor vivir
con la alegría de los hombres
que llorar ante el muro ciego.

Te sentirás acorralada
te sentirás perdida o sola
tal vez querrás no haber nacido.

Yo sé muy bien que te dirán
que la vida no tiene objeto
que es un asunto desgraciado.

Entonces siempre acuérdate
de lo que un día yo escribí
pensando en ti como ahora pienso.

La vida es bella, ya verás
como a pesar de los pesares
tendrás amigos, tendrás amor.

Un hombre solo, una mujer
así tomados, de uno en uno
son como polvo, no son nada.

Pero yo cuando te hablo a ti
cuando te escribo estas palabras
pienso también en otra gente.

Tu destino está en los demás
tu futuro es tu propia vida
tu dignidad es la de todos.

Otros esperan que resistas
que les ayude tu alegría
tu canción entre sus canciones.

Entonces siempre acuérdate
de lo que un día yo escribí
pensando en ti
como ahora pienso.

Nunca te entregues ni te apartes
junto al camino, nunca digas
no puedo más y aquí me quedo.

La vida es bella, tú verás
como a pesar de los pesares
tendrás amor, tendrás amigos.

Por lo demás no hay elección
y este mundo tal como es
será todo tu patrimonio.

Perdóname no sé decirte
nada más pero tú comprende
que yo aún estoy en el camino.

Y siempre siempre acuérdate
de lo que un día yo escribí
pensando en ti como ahora pienso.

 

O MAIOR ELOGIO



Não estar à altura das estúpidas expectativas de um qualquer idiota,

será sempre o maior elogio que me podem oferecer.



2019jun_aNTÓNIODEmIRANDA

A BOA INTENÇÃO

 


Amar é a única coisa que me resta!

… 

(estava escrito na sua lápide).


2019set_aNTÓNIODEmIRANDA

terça-feira, 13 de junho de 2023

ACONTECE

 


Há 

Pequenos Pormenores 

Que 

Passaram Ao Lado 

De 

Uma Grande Carreira


2016,11aNTÓNIODEmIRANDA


AJUDA

 


Onde 

Todos 

Empurram

Queda 

É 

Mais 

Rápida



2016,11aNTÓNIODEmIRANDA


domingo, 11 de junho de 2023

CÃES VADIOS A NAMORAR

 


Era de noite.
Chovia mas ela não ouvia.
O sofá rangia
Virou-se de lado
com todo o cuidado
mas mesmo assim arfava
e os ais não disfarçava.
O esposo inquieto
pousou a mão na almofada
e ela não estava.
Levantou-se de repente
com o coração dormente
e pôs-se a escutar.
Que gemidos estranhos.
Cães vadios a namorar.
Voltou para a cama.
Ela diz que me ama
nada tenho para desconfiar.
Tomou o comprimido
adormeceu com alegria
enquanto ela gemia.



,2019Dez_aNTÓNIODEmIRANDA

AMAR-TE É A MINHA TRAIÇÃO

 


Invocámos o amor eterno,
mesmo sabendo que o inferno
já não ardia como era costume.

E tu
a dizer que o modo como amo
tem o sabor de um jogo repetido.

Amar-te
é a minha
traição.



2019jun_aNTÓNIODEmIRANDA


AQUI NA TERRA

 


Subiste lá para o céu




Aqui na terra
a chuva não lavou
a tua ausência



2019out_aNTÓNIODEmIRANDA


sábado, 10 de junho de 2023

AS PALAVRAS POSSÍVEIS DOS POETAS MENTIROSOS

 

Deixa-me desenhar
-
Te
1
Segredo.
Não inventar
Mais daquilo
Que pouco
Sou.
Abrir
1
Olhar.
Ficar nunca
Onde
Estou.
E caminhar até ti 
com as palavras possíveis 
dos poetas mentirosos.
Ir num verbo sem tempos
às avessas.
Chegar sem pressa
Sem estar
&
Voltar para mim
Sempre que possível.




2018Dez_aNTÓNIODEmIRANDA

AGORA NESTE VULCÃO DE LÁGRIMAS


Escrevo-te nas costas meu anjo caído 
embora não saiba como fugir 
das asas que me mostras.

Riscaste o caminho da ausência prometida 
e no sonho que me deves 
está escrito a infância que roubaste.

Vozes contam palavras escritas 
na parede dos soluços pintados.

Era tão alegre o amor antes do verbo 
sem o tempo incondicional.

Lavo os olhos agora 
neste vulcão de lágrimas sufocadas 
pela pior das ausências.

Diz-me a pele da tua almofada 
que não teria de ser assim.





2018Ago_aNTÓNIODEmIRANDA


TRATADO DE PAZ

 


Então levantou-se
Limpou as mãos
à vergonha
e pegou no andar.
Lázaro!
Lázaro grande traidor!
O que fazes?
Ele vai ficar fodido!
Que te fodas tu!
Que se quilhe ele!
Fiquei cansado deste estar tolhido.
O evangelho
ao diabo pediu conselho.

assinaram
o único e verdadeiro
tratado de paz.


,2020Mar_aNTÓNIODEmIRANDA

RORY GALLAGHER 1948-1995

 


A minha tristeza tem gente demais.
Não quero passear
neste jardim de memórias
observado por vozes gravadas
na pedra.
Claro que estás longe
Nesse andar de choros nos lábios
Que fugiu para o bar.
Eu continuo à espera.

Peço sempre dois whiskies.

Um deles
Será sempre para ti.




,2020Nov_aNTÓNIODEmIRANDA

SILÊNCIOS COMPANHEIROS

 


Tomei qualquer coisa saborosa.
Gosto de ver mas não me lembro.
Nem sei a quem perguntar.
Não confio neste rei sorridente 
e a malvada da rainha não pára de me piscar o olho. 
Saio da prisão do corpo 
pulo a varanda mas ninguém aplaude. 
Só quero abraçar a Alice 
embora no filme digam que já não mora aqui. 
Tenho na cabeça um chapéu que me esconde do mundo. 
Nada melhor que o “boogie” dos Canned Heat (Woodstock 1969), para me acompanhar.
Quando a manhã chegar só quero lembrar o instante dos silêncios companheiros.




,2020Jan_aNTÓNIODEmIRANDA