Que poemas poderão agora ser escritos?
Não sei. Tu é que és o mestre!
Não chamemos estranhos para este serviço,
cuspiu o aparo da minha caneta.
Chegámos à ponte e nem sequer tomámos nota
Dos nomes dos barcos.
E pintámos as manhãs com círculos dourados
Que o sol nos ia entregando.
Poetas como devem ser,
disfarçados de saltimbancos,
acenavam alegremente,
exibindo palavras sem dicionário.
Era tão perto aquela ponte onde nunca estivemos.
O lugar onde ninguém se procura.
Onde querubins com asas tatuadas,
bailavam com bíblias na mão,
e um esquilo fingindo ler o Diário Popular,
mostrava-se atento à nossa inquietação.
Era tarde,
talvez com um cedo demasiado precoce,
para a entrega do último relatório,
onde a primeira página é sempre a mais mentirosa das notícias.
E no relvado daquele parque, cresciam plantas sabiamente regadas por quem só sabia cuidar das rosas.
Havia discursos para todos os gostos, profecias anunciando o fim da eternidade e freiras pornográficas a ler sinas à la carte. E patinadoras com corpos de cisnes infelizes, ofereciam tampaxes mentolados a reformados apressados na espera da chegada da morte. Dos ramos das árvores, pendiam poemas com lamentos desbotados por tanta injúria.
Na hora do almoço, o funcionário da repartição comia o milho dos pombos, e disfarçadamente metia no bolso folhas de alface, como se fossem notas de cinco euros.
Acabava o trabalho com o miserável hálito a alho, e regressava a uma casa que nunca iria acabar de pagar.
No caminho, mantinha o cuidado habitual de não pisar a merda, que o vizinho do lado tinha deitado pela janela.
Acendia as pipocas, ligava a pizza, cumprimentava o hambúrguer e imaginava ligar os 170 canais da televisão que há muito tinha saído da sala.
A mulher fugiu com o melhor amigo, mas o pastor confortou-o dizendo que ela tinha escolhido o caminho do diabo.
Mandou-o em paz e recomendou as orações do costume,
Ela de joelhos no confessionário,
fez-lhe um exorcismo demorado…
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