-1
Tenho muitos prazeres na vida. Espero assim que não me peça juros pelas contas que tenho pago. A minha cabeça não pára de me abanar as ideias, e perversa como ela é, ignora a maleabilidade do meu esqueleto. No sentido inverso da palavra, aperto numa mola os papéis dos recados escritos com letras esquecidas. Não desenhei as gargalhadas que ouço de um recém-nascido já com cabelos no peito. É preciso paciência, diz-me a envergonhada decência, com a minha falta de pudor para apodrecer coisas menores. Preciso de um atestado, emocionado e mesmo não assinado, que ilustre a perspectiva da minha indulgência. Algumas ondas, se o estio for talentoso, flores sujas, se o inverno for amargoso e um q.b. de azia para queimarem a pedra fria.
Saúdo-vos com todo o incenso que rega os sonhos vazios.
Tudo o que ficar será sempre a nossa poeira.
-2
Preciso de uma alcofa para congelar os poemas que não consigo escrever. De um estetoscópio digno e constipado, para de vez em quando lavrar as músicas da minha cabeça. De uma palavra amiga mas não conselheira para picar o gelo dos meus silêncios. Não é muito, diz-me o pai natal mascarado de boneco bolorento. Preciso sobretudo, da equação certa para consertar o meu tempo.
-3
Estou algemado com eloquências aparelhadas num contraplacado neurótico, cortado à medida da minha insolvência. Má sorte ter escolhido esta lâmina onde escorrem gritos que me entontecem. Entreguem-me outro sangue, sem plasma sintético, sem dor insonorizada, mas com penas voadoras cozinhadas na beleza de um sentido atrevido.
-4
Preciso de uma atitude profiláctica, de uma vontade automática, de uma drenagem linfática para a minha coragem de continuar a ser.
-0
Lucidez guerreira que navega numa enseada exaltada para amainar poemas com o passo certeiro fé depravada nesta escudada loucura de ousar um memorandum desqualificado.
2016,11aNTÓNIODEmIRANDA
Sem comentários:
Enviar um comentário