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sexta-feira, 18 de novembro de 2022

LÁ FORA, AGORA JÁ NADA LHE ERA ESTRANHO

 É vegetariana distraída.
Muito ela falava da assiduidade fundamental.
Transporta na mala o suave Channel N5,
não veste peles de animais
e a vistosa echarpe que exibia
era feita com cápsulas de coca cola reciclada.
Abandonou a pobreza que nunca conheceu.
Usa agora,
em tons de azul claro, fora de estação,
uma boquilha com ansiolíticos naturais
criteriosamente supervisionados
pelo seu consultor de normalidades.
Deitada no sofá,
tenta agarrar nuvens para esconder a confusão.
Olha de soslaio os ténis dourados,
imaginando pénis que gostaria de ter na mão.
Hum... desta vez correu muito bem,
dizia-lhe abotoando a bata o doutor.
É bom que assim se sinta.
Da próxima não traga a cinta.
Quero fazer-lhe uma “fodagrafia” como deve ser.
Foi para casa no Mercedes contente.
Falhou os piscas habituais.
Confiante, enfiou  no whisky os comprimidos usuais
só para ficar dormente.
Adormeceu abraçada à lingerie com todo o
cuidado para não se lembrar do amor.
Lá fora,
agora já nada lhe era estranho.

2016,12aNTÓNIODEmIRANDA

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