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terça-feira, 17 de junho de 2025

OBITUÁRIO (para o António da praia de Melides)

 


O que faço com esta memória empoeirada, que esconde no silêncio envergonhado, os recados que me arredam de ti?
Podemos imaginar qualquer coisa, mas o importante continua a não acontecer. Voamos no meio de papéis facilmente queimados pelo sol. Fogem dos ombros, com uma pressa inchada, as palavras que pensávamos, nunca nos iriam mentir. Dormem escondidas, numa lua amachucada pelos dias do futuro. Que lugar estranho este, que já não reconhece o nosso bafo, nem a triste melodia que nos aproxima do fim. Como se a morte fosse uma coisa esquisita. 
Estes monstros não deviam estar no nosso filme.
Conversa triste, como o aviso para que não apertasse as tuas mãos inchadas, e aquela frase terrível que estavas a morrer. 
Estou farto do sabor deste cansaço. Deste brilho escuro que não me deixa dormir. Deste espelho mentiroso que só oferece brilhos de raiva pintados com as cores de todos os medos.
Declaro com a urgência da brevidade de continuar a fintar todo o contrário que me é proposto, que o obituário está temporariamente suspenso. 


Melides, 2019jul_aNTÓNIODEmIRANDA
poemanaalgibeira.blogspot.com

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