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sábado, 29 de março de 2025

George Harmonica Smith - Summertime / MORRE-SE SEMPRE NA VIDA QUE ACONTECE



MORRE-SE SEMPRE NA VIDA QUE ACONTECE

 Sou um vagabundo na lavandaria dos afectos abandonados. 
Um ramo de desesperos, 
deitados na manta que arrefece 
a desilusão do absurdo dos dias, 
escondido no contentor dos lixos indiferenciados, 
chora nos ombros o voo ferido das solidões. 
Na rotunda dos prazeres esquecidos, 
queimam-se anúncios das falsas promessas da salvação. 
Onde estás, crepúsculo dos deuses caídos? 
Estou cansado de andar por aí, 
embrulhado na teia do sonho impossível, 
impaciente no admitir um destino improvável, 
enviado por um call-center  
oferecendo prémios irrecusáveis.
A minha sorte não merece tanta atenção!
Na noite dos desencontros, 
procuro no canto desta pele machucada, 
razões de senso escusado, 
e, queimar nas folhas da sebenta, 
palavras que recuso ouvir.
Morre-se sempre na vida que acontece.
Os culpados jogam monopólio 
nos banhos da batota habitual.

,2021Mar__aNTÓNIODEmIRANDA
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Muddy Waters & George Harmonica Smith - Walking thru the park, 1971

domingo, 23 de março de 2025

ACEITÁMOS O INACEITÁVEL # in DESOBEDECER_ Frédéric Gros (tradução de Miguel Martins) #

 


Skid Row_ Santa Apolónia
_ Almirante Reis_ Cais do Sodré


Morre.

Morre depressa.
A tua vida é um empecilho.
Só te prometo uma bala rápida 
para alegria do gatilho.
Desaparece.
A tua pena enoja-me.
Nada do que quero podes oferecer.
Vives na tenda dos milagres encardidos.

Morre.

Não me faças perder tempo. Não me interessa o teu lamento, nem esse olhar agradecido pela miséria que te ofereço. Nada pagaste das mentiras que vendi. Serás sempre aquilo que não presta. Uma oração falida, nunca ouvida pelo deus que comprei. A tua mão estendida não vale um cêntimo de compaixão. Tens a fome que mereces. De nada adiantaram as preces enroladas no teu desespero. Eu sou agora o teu único deus. O prometido. Chevrolet rompante - jantes douradas no prazer que te roubei. 

Morre. 

Só pode ser essa a tua última vontade. Não desiludas a ideia. Farei de ti um oásis farpado, embrulhado na bandeira que te pariu. 
Morre como quiseres. 
Mas, sempre de acordo com a minha necessidade. Morre. Ergue as lágrimas para o meu céu estrelado. Arfa na forca o último orgulho. Ajoelha para as chicotadas que te ensinaram a falar. Sê discreto. A sobriedade é uma das qualidades que aprecio.
Se me vou lembrar de ti?
Se calhar, não me apetece.

Morre!

“desobedecer é uma declaração de humanidade”











,2020Jan_aNTÓNIODEmIRANDA
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SEM EMENDA

 


Amo-vos num troco 

demasiado vazio.

Sou

apenas um teso

sem emenda



,2019mar_aNTÓNIODEmIRANDA
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quarta-feira, 19 de março de 2025

DEPOIS DISSO...

 

O mundo continua a ser um problema.

Depois disso, um leque de sons balbucia entre os dedos o silêncio trovejante desenhado numa tela em câmara fotográfica.

Depois disso, um voo de parasitas tingiu de sangue a carência da humanidade.

Depois disso, a modéstia quase cruel, enlouqueceu no hospício da inocência, como se fosse uma tarefa angustiante.

Depois disso, a espera permaneceu inalcançável relegando o convite para a viagem das boas memórias.

Depois disso, o simulador de contentamentos adequados às necessidades, presenteou o gestor de fracassos com cândidos traumatismos, afamados coordenadores de afinidades alheias.

Depois disso, técnicas de engate ao virar da esquina da
inquietação, conseguiram finalmente o alvará para remodelações com prazos de entrega escrupulosamente mentidos.

Depois disso, o rio grande da penúria guarda-as-lamas da justiça, e no farol da perseverança a orquestra dos afectos, fechou as portas da 
oficina do erro.

Depois disso, os auspiciosos encantos do celibato deixaram de ser penalizados de acordo com a taxa de masturbação indexada ao acentuado aumento de tendinites.

Depois disso, calcada no conto do alfarrabista,
uma ligação preciosa anota no diário das amizades as sagradas conversas sem nome.

Depois disso, patetas que se dizem “puetas”, aparecem em homilias de copo presente perante a useira bajulação da habitual assembleia de letrados jumentos.

Depois disso, o olhar descorçoado do Poeta Camões, rasga canto a canto as palavras agora inúteis.

Depois disso, 
O mundo repetirá o mesmo erro.
Depois disso, 
Em caso de Emergência  não  ligue à Retórica mal parida.




2025_Mar18_aNTÓNIODEmIRANDA
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2ª ELEGIA PARA UM MOLOTOV

 

MAMÁ,

O QUE OFEREÇO 

AO PAPÁ?

FILHO

O MOLOTOV

ESTÁ 

NO FRIGORÍFICO.

PÕE-NO

A

DESCONGELAR.



,aNTÓNIODEmIRANDA
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domingo, 16 de março de 2025

quinta-feira, 13 de março de 2025

SUAVE MIAR

 




Muitas outras coisas poderiam ser ditas 
se me contasses a razão 
dessa alma tão triste.

Por vezes penso em ti 
como se fosses a namorada do liceu 
mas a vergonha apesar dos anos não mudou. 

Continua anichada naquele canto 
que já não procuras. 

Deixei de ser o gato 
que costumava uivar à janela.
 
Agora não passo de um velho lobo 
que num suave miar 
espalha o perfume da constante ausência.

Poucas coisas já me restam 
e todos sabem que passos curtos 
não ambicionam longas estradas.







,2024Mar08_aNTÓNIODEmIRANDA
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Tomás Miranda: “Eu tenho a obrigação de preparar as notas para o músico”

 https://l.facebook.com/l.php?u=https%3A%2F%2Fwww.rimasebatidas.pt%2Ftomas-miranda-eu-tenho-a-obrigacao-de-preparar-as-notas-para-o-musico%2F%3Ffbclid%3DIwZXh0bgNhZW0CMTAAAR2PQAteo99xBXaazz1ZxqqczuP2g23dT7rayxJiUUUidGkB_HqhF9gJ3W4_aem_cR-WkXXYfTgymyt_wGwf4Q&h=AT1Lzws-gi1McVOfs0G0oD9tAkDclKc8fA6fdvuyH_b31Rj0Nv9Iw7wbs_d0xaAqP3tkuZIdLoC9uaunxaIfls0glQUxF18rg88OfsSeSDGf3Kixf2KOwoZiETnHzs7VDg1WYc4SSwGwelg&__tn__=-UK-R&c[0]=AT2E5TWLPMmCOJ7RkZ5k5hkOoDibB6H7qKfYvqJeDFfBamBnrwNHt2ffT300pEZgla37q5k_hV9sbMybHYhZmBU78fZ4mYn1QA765rBLMfn46MR5As_LIjm1LvFwwgABJbkNTN6pjLqtwwS1BbVlB0t5zlvbv6BcHS8fIRoJza64CkxwZ5Sq

segunda-feira, 10 de março de 2025

EU E A SOLIDÃO DOS OUTROS QUE FELIZMENTE NÃO CONHEÇO

 


                Há um vazio na sombra 
                que me irá acordar.~

                Há um tempo que vai secando 
                o sangue recusado.

                E na noite das mãos 
                estendidas 
para a alma vazia,
mal diz da sina 
                que no coração lhe arde.

                Terra, pó, saudade, 
choro na guerra do tempo 
sempre a arrancar a flor da vida, 
beijado num canto infinito.

          Há uma panóplia de sentidos 
que oferece sorrisos órfãos
ao penhasco da desilusão.







2025Mar07_aNTÓNIODEmIRANDA
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ESPIRRAR LAPSOS DO TEMPORAL

 


                    Nas asas do conforto 
tento esconder os tropeços
como se mais pedaços de mim 
embalsamados em lençóis ´
de ferrugento cetim
fugissem do inadiável encontro 
.
            Num céu de orquídeas 
            a orquestra dos tempos 
desafinados
            contempla a chaga 
do golpe final.





2025Mar_aNTÓNIODEmIRANDA
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domingo, 9 de março de 2025

ORAÇÃO DA NOITE

 


Todos os dias me retiro 
antes que a morte se aproveite 
do cansaço.
Todos os dias faço 
por me acontecer
 logo que a despedida corra a
 entontecer a sorte.
Todas as noites afasto a espera 
mentindo uma inútil satisfação.
Lembro-me demasiado desta memória 
reles produtora de réplicas.
E na cadeira das ilusões, 
qual armadilha de tanta dor, 
embrulho sentimentos 
que não poderei reparar.
    Vou andando por aqui 
    a esculpir pecados que nunca chegarão 
à redenção.
    Tantos sonhos impunemente arruinados.
Gostaria de não acreditar tanto,
na distância que se veste em mim.







,2024Fev03_aNTÓNIODEmIRANDA
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sexta-feira, 7 de março de 2025

ELOGIO DA PRESSA

 Devagar se vai ao longe.

Se assim for,

lá chegarei,

enfeitado

num fato

de

teias de aranha


,2020Fev_aNTÓNIODEmIRANDA
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segunda-feira, 3 de março de 2025

NADA DE NÓS SERÁ MEMÓRIA - Afinal tenho 70! (a culpa continua a não ser minha).

 


Corre a vida neste tempo desalmado
onde o longe procura o nunca
como o rio que caminha para o mar.
Um barco apavorado
desenha ondas tingidas de avidez.
Ninguém me acode nesta dúbia salvação.
Uma batida de convites cavalga
na vermelha passadeira em busca 
de ovações ainda não camufladas.
Uma bola de pingue-pongue,
(também ainda por inventar),
foge sorrateiramente da bolsa dos 
defeitos.
Ninguém chora neste tango atrevido.
Onde adormeces cambaleante tropel?
Não me canses.
Sigo usado neste tempo,
Aterrado nesta confusa salada de 
suposições.
E esse andar de bailarina, 
roda-viva 
assassina, anel desavindo, 
sangue ardido, paixão sem flor.
Estarás por aí?
Falas-me com lábios de ausências.
Nada leio nesse abecedário.
Temos cores diferentes neste pantone
de desavenças.
Agora o longe abraça o nunca.
Por fim,
nada de nós será memória.


2025Mar02_aNTÓNIODEmIRANDA
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domingo, 2 de março de 2025

DEPOIS

depois fica o vento
que quando sopra me trás os teus beijos
fica o sabor do momento
feito chuva de desejos
resta o nada que me afoga
e as lágrimas que choram
não sei porque sentimento
depois fica o tempo
que nada sabe de mim
depois fico assim
feito espuma sem dias
sem o fogo que tu acendias
depois perco a alma no teu olhar de ternura
e sei que não foi loucura
embora me reste a dor
vou dar todo o meu desespero
não negarei nunca o amor
mesmo aquele que não foi suficiente
mesmo a paixão vivida sem tempero
agora abraço os lençóis dum corpo ausente.
depois eu sei que tudo entre nós foi diferente

setembro12.2006_aNTÓNIODEmIRANDA
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sábado, 1 de março de 2025

AI EU !

 


                    Ai eu !

                        Que às vezes 

                                         nada sei 

                                                De mim!


                                Também não sei,

                            Porque tenho dias 

                                que me fazem assim...






,2016_aNTÓNIODEmIRANDA
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