Se
isto fosse um poema, beijava
a oração do descrédito dos poetas do fim do longe. Enlatava os
erros de palmatória, queimava a tristeza absurda que assola as
perspectivas e barrava todos os naufrágios deste mar que só lavra a
terra do desperdício. Se
isto fosse um poema, as
horas que me roubam teriam outro tempo e a exactidão dos ponteiros
não se aproximaria tanto da fatalidade. Se isto fosse um poema, não
teria nojo de toda esta mentira, que tudo me tira nestes dias
cortados em fatias envenenadas. Se isto fosse um poema, não
lamberia esta gelatina de destroços que me congela os ossos em
alguidares de menosprezo. Se isto fosse um poema, queimava o mundo
que me vira as costas e a dignidade significada em formas de postas,
que me oferece a mais pobre afinidade. Se isto fosse um poema, não
seria menos que o resto, e o que de mim dizem faltar, oferecido em
festins nus numa festa definhada. Se isto fosse um poema,diria que
ler certa poesia, é por vezes um hobby nojento. Se isto fosse um
poema, na sombra da árvore sagrada dos versos, sentir-me-ia existir
agradecido às folhas que pousavam no meu firmamento, pintava assim
as horas amigas, soletrando prazeres com abraços de poetas
companheiros, que pisam o mesmo chão.
2017,jun_aNTÓNIODEmIRANDA